Espectáculo, ou talvez não
Poucos leitores deste blogue saberão que, em tempos idos, nem interessa bem quando, escrevi duas colecções de livros juvenis para a então famosa Verbo, tendo ultrapassado os quarenta títulos publicados e vendido mais de um milhão de exemplares; nada de especial, se comparada com Enid Blyton, mas muito bom, se me lembrar de que foi assim que viajei durante muitos anos e pude meter o nariz nos cinco continentes (em alguns deles, foi mesmo só a pontinha do nariz). Depois dessa experiência (é talvez mais correcto dizer «durante»), escrevi também um romance e três livros de poesia e, embora a imprensa me tenha dado alguma atenção, nunca a televisão me convidou para falar deles (exagero: fui a um programa que Bárbara Guimarães manteve na SIC num período em que a Nação atravessava melhores dias e tive direito a uma edição inteirinha do Ler+, apresentado por Teresa Sampaio, no âmbito do Plano Nacional de Leitura). Nos últimos anos, chamaram-me umas quantas vezes para falar de edição e de livros que tinha publicado, mas, ainda assim, sempre em horários ditos pouco nobres e canais com menos audiências. Ora, desde que escrevo letras para fados, os convites para ir falar da canção portuguesa ou dos seus intérpretes, sobretudo depois da elevação do Fado a Património Imaterial da Humanidade, multiplicam-se; e, só numa semana, foram três os pedidos para participar em programas e documentários. Fiquei a pensar que é uma pena que a literatura não tenha esta dimensão de espectáculo para poder aproveitar este meio que é a televisão e chegar a mais gente. Não por mim, que já quase não dou à pluma fora deste blogue («pluma» é força de expressão), mas porque gostava que alguns autores tivessem mais leitores, todos os leitores que (os) merecem. O problema é que sempre que um escritor consegue um certo grau de mediatismo também há logo quem desconfie...