Havia e há
Gosto de acompanhar os jovens – não me interpretem mal, estou a falar apenas de escritores e dos seus livros e, além disso, sou casada e gosto. Além disso, o jovem em quem estou a pensar agora é uma mulher, o que tornaria tudo ainda mais improvável, dando-se o caso de eu me sentir atraída, até ver, apenas pelo sexo oposto. Mas adiante: falo de uma jovem autora, nascida em 1982, que se estreou com um livro chamado Diálogos para o Fim do Mundo, vencedor do prémio Maria Amália Vaz de Carvalho, da Câmara Municipal de Loures, em 2009 e publicado no ano seguinte pela Caminho; que agora reincide com um conjunto de pequenas ficções com o título Havia – a palavra com que começam absolutamente todas as histórias –, cuja capa é bastante original, pois reproduz parte de uma ficção do interior sobre – isso mesmo – a capa de um livro. Joana Bértholo, cuja biografia se inclui no volume como mais uma das muitas histórias, é uma cultora do absurdo e tem inteligência e talento suficientes para compor um leque apreciável de narrativas divertidas e modernas que se lêem de um fôlego e vêm acompanhadas das ilustrações de Daniel Melim, que também assina o posfácio (iniciado por «Havia», como não podia deixar de ser). Embora seja sempre difícil, num livro experimental deste tipo, que todos os textos tenham o mesmo nível, devo confessar que o equilíbrio é muito satisfatório e que a opção de fazer seguir cada uma das ficções de uma espécie de versão condensada e adulterada das mesmas – quantas vezes ainda mais mordaz – enriquece extraordinariamente a leitura. Havia… e há.