Patenteado
Passo, como todos calculam, horas infindas a ler livros em bruto, versões que os autores entregaram ao editor cedo demais, nas quais transparece muitas vezes talento e imaginação, mas falta uma revisão atenta e crítica. Esses livros «embrionários» obrigam a mais do que uma leitura, a reflexão demorada, a uma procura de soluções para problemas específicos; e, quando tudo isso é processado, a propostas de alteração frequentemente profundas. Na maioria das vezes, tenho, porém, a sensação de que o autor, se fosse menos ansioso e apressado, acabaria por chegar sozinho às mesmas conclusões, poupando-me, claro, muitíssimo trabalho. António Lobo Antunes, numa entrevista ao vivo conduzida por Carlos Vaz Marques há uns dias numa sala do cinema S. Jorge (por ocasião dos 25 anos da revista Ler), disse que as primeiras versões dos livros lhe saíam relativamente bem e depressa, tendo até a mão dificuldade em acompanhar a rapidez do pensamento; mas era então que começava verdadeiramente o trabalho – ler, reler, rever, refazer, cortar, alterar – e era isso que demorava realmente meses; explicou ainda que era fundamental usar o «detector de merda» [sic] para tirar do «rascunho» tudo o que era excesso, gordura, porcaria. Não há, por acaso, ninguém que queira patentear um instrumento como este para me facilitar a vida?