O efeito dos prémios
Há muitos anos, ainda na Temas e Debates, publiquei um livro de J. M. Coetzee que era uma mistura de ficção e não-ficção; tomando a história inventada de uma conferencista que devia fazer uma palestra numa universidade sobre literatura, mas se debruçava inesperadamente sobre o tema dos direitos dos animais, o livro apresentava na íntegra a sua palestra fictícia, à qual agregava os comentários de quatro especialistas reais, entre os quais o filósofo Peter Singer. Era uma obra francamente original intitulada As Vidas dos Animais, mas vendeu-se muito mal na altura em que saiu, quiçá devido ao seu carácter híbrido. E, no entanto, por um bambúrrio de sorte, Coetzee venceu o Nobel da Literatura nesse ano e o livro em causa era um dos poucos da sua autoria disponíveis no mercado. Resultado: tornou-se um êxito de vendas em pouco mais de um mês... O anúncio dos prémios e a sua divulgação nos meios de comunicação social têm um efeito inegável nos consumidores, mesmo no que toca à literatura. Em 2011, publiquei o primeiro romance de Nuno Camarneiro, No Meu Peito não Cabem Pássaros, que vendeu moderadamente, como costuma acontecer a obras de estreia. Porém, assim que se soube que o autor vencera o Prémio LeYa com um inédito que há-de ver a luz lá para Março, as livrarias começaram a encomendar desenfreadamente o romance anterior, foi preciso reeditá-lo a correr, e na semana que antecedeu o Natal as vendas devem ter sido mais do que no período que decorreu entre a publicação e o anúncio do prémio. É verdade que Nuno Camarneiro foi entrevistado por todas as televisões e jornais nacionais e apareceu nos noticiários à hora do jantar, entrando na casa de muitos portugueses que se calhar não frequentam livrarias regularmente, mas estaria condenado a ser um escritor praticamente desconhecido se não tivesse ganho o prémio?