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Horas Extraordinárias

As horas que passamos a ler.

30
Jun17

Ignorância

Maria do Rosário Pedreira

Contaram-me que muitos americanos nunca viram um peixe senão em filetes, no prato, e que ficam estarrecidos quando lhes servimos aqui em Portugal um corpo escamoso, com uma espinha a meio, além de rabo e cabeça, ficando sem saber o que fazer com ele (mas depois gostam, claro). Também me disseram que, nos EUA, quando pedem a algumas crianças para desenharem uma galinha, elas a desenham depenada e embalada, tal como a encontram no supermercado. O Washington Post noticiou, porém, recentemente algo de bradar aos céus que até parece brincadeira... ou mentira. Publicando os resultados de um estudo realizado por um Centro de Inovação Americano, declara que 16 milhões de adultos norte-americanos (cerca de 7% da população) acham que o leite achocolatado que se vende nos supermercados provém de vacas castanhas, desconhecendo, aliás, que o chocolate é feito de cacau, leite, açúcar... Enfim, torna-se para mim cada vez mais claro como é que Trump chegou a presidente... Bom fim-de-semana!

29
Jun17

Ai, Dylan

Maria do Rosário Pedreira

A escolha de Bob Dylan para vencedor do Prémio Nobel da Literatura está desde o início envolta em polémica. Primeiro, foi o facto de se tratar, acima de tudo, de um escritor de canções, e não de um escritor no sentido mais tradicional; depois, foi o silêncio do premiado, que esteve sei lá quanto tempo sem atender o telefone à Fundação Nobel e sem se pronunciar sobre a circunstância de lhe terem atribuído o galardão. Quando finalmente decidiu acusar o toque e parecia que tudo correria bem, faltou à cerimónia marcada para a entrega do prémio, em Estocolmo, alegando compromissos enquanto músico (sabe-se lá se com uma remuneração superior à do prémio, que é de 820 e tal mil euros). Mesmo assim, era obrigatório entregar o discurso de aceitação para poder receber o valor do prémio e só uma semana antes de o prazo terminar Dylan se dignou a fazê-lo; o discurso, que julgo estar disponível online para quem o queira ler, falava de alguns livros que marcaram o músico-autor (que escolheu, aliás este nome artístico por causa do poeta Dylan Thomas), entre os quais se destacava o romance Moby Dick. Mas agora uma professora diz que ele roubou várias frases sobre a obra de Melville a um site de resumos de obras literárias usado especialmente por estudantes de literatura que não têm vontade de ler os livros de fio a pavio... Oh dear! A polémica não pára. 

28
Jun17

Livraria favorita

Maria do Rosário Pedreira

Há cada vez menos livrarias de jeito em Portugal – e muitos já se habituaram a comprar livros em supermercados, tabacarias e bombas de gasolina. Mas frequentar uma livraria que tenha pessoas que sabem o que fazem é muito diferente de fazer perguntas a um funcionário que se limita a ir ao computador para ver em que prateleira está o livro A ou B. É por isso que todos os anos os Portugueses são convidados pela APEL (Associação Portuguesa de Editores e Livreiros) a votar na sua Livraria Preferida – e é bom quando vemos recompensado o esforço e o trabalho de livreiros que conhecemos e apreciamos. Foi o caso, por exemplo, da A das Artes, em Sines, que já ganhou este prémio no ano passado e foi agora eleita a livraria com melhor atendimento, e é o caso da Livraria Buchholz, desde 1965 junto ao Marquês de Pombal, em Lisboa, que, além de ser um espaço bonito que cheira a cultura por todos os lados, tem uma equipa muito simpática e eficiente. Parabéns por ter sido a Livraria Preferida dos Portugueses em 2017!

27
Jun17

As vozes do silêncio

Maria do Rosário Pedreira

Já de há alguns anos a esta parte que a Fundação Calouste Gulbenkian, com a supervisão de Helena Vasconcelos, promove um concurso de leitura de textos literários – muitos de poesia, mas não só – feita por jovens. No fim-de-semana passado, os vencedores da edição de 2015 do Dá Voz à Letra (assim se chama a iniciativa) – João Teixeira, Matilde Anjos, Maria Casquinha, Pedro Freitas e Rita Sousa – realizaram um pequeno espectáculo dirigido por Carlos Pimenta e com sonoplastia de Tiago Jónatas intitulado Sons no Silêncio, aproveitando o belo cenário da clareira do Jardim da Gulbenkian. Os textos, escolhidos por Helena Vasconcelos, construíam um diálogo entre dois poetas (a que alguém chamou também uma espécie de duelo): Fernando Pessoa (melhor dizendo, Álvaro de Campos) e um poeta norte-americano que aquele muito admirava (e nós também): Walt Whitman, autor do fabuloso Leaves of Grass (Folhas de Erva). Terá sido estupendo, mas, para quem não sabia ou não pôde ir (o meu caso) vai haver uma repetição no próximo fim-de-semana (dias 1 e 2 às 16h00) – e a melhor notícia é que a entrada é livre.

26
Jun17

Um Parténon diferente

Maria do Rosário Pedreira

Se já foi a Atenas, conhece seguramente o Parténon, construído sob a supervisão do escultor Fídias entre 447 e 38 a. C. para albergar uma estátua colossal da deusa Atena e as reservas de prata da cidade, protegendo-as de um eventual ataque dos Persas. Durante a Idade Média o templo foi transformado em igreja cristã e, no Renascimento, em mesquita, calculem; mas hoje o Parténon é sobretudo um símbolo da democracia que, como todos sabemos, nasceu na Grécia. Ora, a artista argentina Marta Minujín, que tem um projecto intitulado «A Queda dos Mitos Universais», no qual se apropria de monumentos icónicos para os desconstruir e reconstruir, agarrou no Parténon para o tornar uma espécie de repositório de livros proibidos e fez um Parténon preenchido com mais de 25 000 exemplares de obras apreendidas na Argentina nos anos da ditadura. O seu monumento respeita a escala do verdadeiro Parténon e, depois de ter estado numa praça de Buenos Aires (primeira fotografia), vai ser replicado na cidade alemã de Kassel, onde está a tomar forma mediante a doação de exemplares pelos interessados. O link abaixo explica como podemos fazer. Que ideia fantástica, não?

http://www.documenta14.de/en/news/1601/call-for-book-donations

 

Minujin_Marta_Partenon_inclinado.jpg

d14_The_Parthenon_of_Books_Construction_©_Rosa_Ma

 

 

23
Jun17

Vinte anos depois

Maria do Rosário Pedreira

Em 1997, O Deus das Pequenas Coisas, maravilhoso romance de estreia de Arundhati Roy, seria o primeiro de uma autora indiana residente fora do Reino Unido a ganhar o Booker Prize e a conseguir traduções em dezenas de línguas, vendendo cerca de 8 milhões de exemplares e catapultando a escritora para a fama. O livro (que assiste ao crescimento de dois gémeos de sexos diferentes em Kerala e se debruça, entre outras coisas, sobre o problema das castas) é inesquecível, belo, terrível e profundo, e quem o leu ficou obviamente à espera de que a autora – que também era linda de morrer quando o escreveu – continuasse a brindar os leitores com obras-primas. Mas Arundhati Roy estava mais interessada em fazer política e foi escrevendo artigos e manifestos, deixando para trás a ficção… Até que, recentemente, vinte anos passados, regressou com um romance em lançamento mundial – O Ministério da Felicidade Suprema (publicado entre nós pela ASA) –, obra que levou, pelos vistos, dez anos a ser escrita e foi buscar alguma coisa ao activismo da autora, sobretudo no que toca às grandes injustiças da sociedade actual na Índia e aos tumultos na região de Caxemira. Estou curiosa, claro, e tenciono começar a leitura muito em breve. Mas tenho medo, porque a fasquia está alta e li algures que este livro está carregado de dez anos de mágoas, mas não é tão bom como o outro… Veremos.

22
Jun17

Amor no papel químico

Maria do Rosário Pedreira

Quando comecei a trabalhar na edição, ainda ninguém tinha computadores pessoais – e só dois ou três anos mais tarde tive direito a uma máquina de escrever eléctrica. No início, a máquina era dessas pesadonas que faziam trrriiim quando chegávamos ao fim da linha; e eu tinha de pôr no rolo duas folhas separadas por outra de papel químico para ficar com uma cópia de tudo o que enviava. Parece mentira, não é?… Bem, mas uma folha de papel químico de um tempo passado, se encontrada na modernidade, pode conter verdadeiros tesouros. Os investigadores da obra da poetisa Sylvia Plath que o digam, pois descobriram, escondida dentro de um dos caderninhos da senhora, uma folha de papel químico dobrada que tinha a marca de dois poemas até então desconhecidos, escritos, pelos vistos, no início do relacionamento da escritora com o também poeta Ted Hughes, provavelmente no regresso da lua-de-mel. Durante cinquenta anos, ninguém tinha posto os olhos em tais textos nem sabido da sua existência, mas o carbono guardou memória das palavras e agora foi possível aos académicos ter novos elementos sobre a forma como Plath e Hughes interagiam e trabalhavam (o mesmo papel químico tinha um índice de um livro de Hughes dactilografado por Plath, julga-se). Com a tecnologia, acabaram-se estas preciosidades inesperadas. De que se farão as surpresas no futuro?

21
Jun17

Deixar marcas

Maria do Rosário Pedreira

É bom quando a leitura de um livro deixa marcas, sinal de que mexeu connosco e de algum modo nos transformou. O livro que mais logo vamos lançar na Livraria Ler Devagar da LX Factory, apresentado pela escritora Dulce Maria Cardoso, não só deixa marcas nos leitores como fala de muita coisa que deixou marcas nas várias personagens. Mesmo que o tempo passe e a pele pareça imaculada, há coisas que nunca desaparecem, que ficam a latejar para sempre, como reza o título, Debaixo da Pele. Falando dos jovens e pelos jovens como poucos sabem, David Machado oferece-nos um romance em que crianças e adolescentes têm muita coisa a dizer, até porque alguns foram transformados em adultos pela força das circunstâncias – ou porque estavam completamente desprotegidos, ou porque o medo de que algo lhes acontecesse levou a que fossem demasiado protegidos. O resto? Só lendo e, claro, ouvindo Dulce Maria Cardoso mais logo. Estão todos convidados.

Convite_debaixo_pele.jpg

 

20
Jun17

Óbidos 2017

Maria do Rosário Pedreira

Depois de muitos rumores que punham em dúvida a existência este ano do FOLIO, em Óbidos – quiçá porque os fundos europeus tinham sido, ao que parece, desviados para o surf, afastando dois dos seus principais figurões (Anabela Mota Ribeiro e José Eduardo Agualusa, que estão agora na organização da Feira do Livro do Porto) –, a organização acaba de confirmar a iniciativa para Outubro próximo e, com ou sem fundos, a verdade é que existem convidados de peso. Sob o tema Revoluções, Revoltas e Rebeldias (muito bem, até porque aproveita para comemorar o centenário da Revolução Russa!), o certame trará à belíssima Óbidos o grande Raduan Nassar, que venceu o Prémio Camões no ano passado «apenas» com três livros, e o seu conterrâneo Milton Hatoum. Estarão do mesmo modo Laurent Binet (que escreve sobre o meio literário com humor), o espanhol Fernando Aramburu (de quem só tenho ouvido coisas boas) e, entre muitos outros já confirmados, o colombiano Jerónimo Pizarro, que é um dos maiores especialistas em Fernando Pessoa. De Portugal, teremos Mário Cláudio, Mário de Carvalho e Dulce Maria Cardoso, pelo menos. E haverá música, com Rodrigo Leão, Maria João e muitos outros, num cruzamento irresistível com a literatura. A programação é extensa – e por isso não temos razão para ter medo de que o festival não se realize. É só preciso saber esperar.

 

19
Jun17

Galveias de volta

Maria do Rosário Pedreira

Quando eu era estudante, gostava muito de ir ler e estudar para o jardim do Palácio Galveias, ao Campo Pequeno, onde havia uns pavões que às vezes largavam uns gritos impossíveis. Esta Biblioteca, que pertence à Câmara Municipal da capital e estava encerrada há cerca de dois anos, acaba de reabrir depois de obras importantes que transformaram um espaço de leitura para cerca de 100 pessoas noutro com mais de 330 lugares. Prestes a completar 86 anos de existência, a biblioteca tem um acervo de cerca de 120 000 documentos e é um sítio muito especial e luminoso onde, ao longo do tempo, se têm realizado, dentro e fora do edifício, vários lançamentos de livros e exposições (e agora já não há pavões para interromperem os discursos, pois foram postos no Museu de Lisboa, uma vez que fugiam para os túneis da Avenida João XXI e punham a sua vida e a dos automobilistas em risco.). Além de novas valências, como dois balcões para empréstimo de livros, uma loja e computadores para que os leitores possam aceder à Internet, há ainda novidade de uma máquina de auto-empréstimo, que permite a devolução de materiais fora da hora do expediente, e de um projecto de apoio aos sem-abrigo da zona, ensinando-os, por exemplo, a fazer um currículo. Estou morta por lá ir dar uma espreitadela. (A foto abaixo é de Enric Vives-Rubio, do jornal Público.)

 

1138477.jpg

 

 

 

 

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