Sexo, mas pouco
Nós, os Portugueses, somos um povo algo contido em matéria de sexo, talvez por força da repressão que a Igreja católica exerceu sobre nós ao longo de muitos anos; e, quando a revolução abriu as portas a uma certa libertação e tirou a prática sexual da lista dos pecados a merecerem castigo divino, o estado de graça não durou nem duas décadas, pois logo apareceu o vírus da SIDA, uma outra espécie de ameaça. Provavelmente por isso, na literatura portuguesa o sexo mostra-se pouco, mal ou muito discretamente; e, durante décadas, quem ousava dar-lhe corda raramente ultrapassava um efeito ridículo ou inverosímil. Lembro-me de um artigo publicado no Jornal de Letras há anos sem fim, em que Inês Pedrosa extraía dos romances nacionais cenas de sexo caricatas que, arrancadas ao contexto, podiam realmente fazer rir e chorar. Deve ter sido mais ou menos na mesma altura que li o belíssimo romance A Estação das Chuvas, de José Eduardo Agualusa, descobrindo um fôlego fantástico para as coisas do corpo e da sexualidade que nunca tinha encontrado num autor de língua portuguesa. É bem possível que a África, mais descontraída e quente, tenha a sua quota-parte de responsabilidade, mas lá que ali o sexo era bonito, ninguém pode negar.