Tenho vindo a reparar que, de há uns tempos para cá, as listas dos livros mais vendidos em Portugal têm sempre, nos primeiros lugares, livros de culinária (agora a vedeta é Marco Costa e o seu Receitas com Segredo – e temo dizer que não faço a mais pequena ideia de quem é Marco Costa, mas suponho que alguém vindo da TV, porque vende mesmo muitos livros!). Eu bem sei que nem sou o que se pode chamar um bom garfo, nem uma boa cozinheira (aliás, só cozinho mesmo quando tem de ser porque cozinhar me dá stress e, ainda por cima, o resultado é normalmente uma coisa sem piada); mesmo assim, acho que há claramente um exagero no número de livros e programas de TV dedicados à gastronomia em geral e à cozinha em particular nos dias de hoje: livros de receitas de famosos (Sá Pessoa, Avillez, Rui Paula, etc.), o que até seria mais ou menos esperado, mas também muitos outros de tias, primas, amigas e tipos giros de avental que gostam de cozinhar e põem toda a gente a dar-lhes atenção, já para não falar das receitas adequadas a quem quer emagrecer, ou é vegetariano, ou é alérgico à lactose, ao glúten e a outras coisas. Até o Manel foi fazer um dia destes um curso de cozinha para principiantes e já comprou mais uns livritos (embora ainda não tenha feito nada a partir deles, já me brindou com um excelente Bacalhau à Brás... ou Braz?). Alguém me explica este súbito interesse pela comida e os livros de receitas por parte de tanta gente?
3 comentários
ANtónio Luiz Pacheco 23.05.2017
Sempre me interessei por "comida", tanto no sentido de "encher o bandulho" quanto da origem e confecção dos produtos (aliás minha mãe dizia que comida é o prato preferido do meu filho!), depois por culinária e por alimentação em geral, até por ter tido a dita de desenvolver uma carreira na distribuição alimentar com as necessárias ligações à indústria alimentar. Fora isso adoro comer e cozinhar! Desde sempre, sou até conhecido por ser um bom cozinheiro - e tenho vaidade nisso!
No entanto há actualmente e nos últimos anos um certo "modismo" na culinária, que é óbviamente incentivado e explorado pela indústria alimentar e em toda a fileira, onde se incluem os programas televisivos e a edição de livros a respeito. Não é no entanto apenas uma moda, apsera de poder parecer que sim, e sim o aproveitamento de algo tão importante quanto bom: a alimentação!
Muito pouca gente não gosta de comer, que eu saiba só os ascetas, e me perdoe a Nossa Extraordinária Anfitriã, mas ser um bom garfo é comer bem (bastante) e não significa que não seja na mesma uma gourmet ou uma epicurista, comendo pouco e não tendo tendência para cozinhar... por certo que gosta de coisas boas, no sentido palatal!
Já que estamos num site de livros, não conhecem "O suave milagre"? Já aí existe a gula e se trata de comida... não sei qual a obra de culinária mais antiga que exista, alguém conhece? O Gargântua? E a cena n'O Avarento, em que o criado sugere ao amo o famoso lema: Como para viver, não vivo para comer?
"De re coquinaria" é o primeiro registo de culinária conhecido. Trata-se de um livro de receitas romanas, elaboradas por Apício (25 a.C - 37 d. C). Em Portugal o primeiro livro de culinária é o manuscrito conhecido como "Livro de Cozinha da Infanta D. Maria", tendo data crítica entre os finais do século XV e o século XVI e pertenceu à Infanta D. Maria de Portugal, neta do rei D. Manuel I. Sobre este e outros livros de referência ao longo da história da alimentação pode encontrar informações no meu livro "Cinco Séculos à Mesa", editado pela Maria do Rosário Pedreira, em 2016, com a chancela da D. Quixote. http://horasextraordinarias.blogs.sapo.pt/cinco-seculos-a-mesa-377565 http://horasextraordinarias.blogs.sapo.pt/a-mesa-em-coimbra-379435 Um abraço e boas leituras (bem temperadas) Guida Cândido