Escrita criativa
A primeira vez que ouvi falar de escrita criativa foi há muitos anos, a propósito de um autor inglês que então era apenas uma promessa (Ian McEwan) e que saíra de uma universidade, East Anglia, que, ao que parecia, era uma espécie de fábrica de escritores. Muito mais tarde, contactei com autores portugueses que davam aulas ou promoviam oficinas de Escrita Criativa, com exercícios e tudo, e cheguei a publicar um pequeno manual que era seguramente uma boa ajuda para adolescentes sequiosos de passarem ao papel as suas ideias de forma organizada. Porém, nunca achei que ninguém se pudesse tornar escritor apenas por frequentar cursos desse tipo, acreditando, como ainda acredito, que o talento não se aprende – ou se tem, ou nada feito. Quando comecei a publicar autores portugueses, apercebi-me também de alguns malefícios destes cursos, pois os candidatos a escritores começaram a descrever os narizes das personagens até à exaustão e a dizer invariavelmente de quantos lugares era o sofá... Recentemente, li a este respeito uma notícia interessante. O reputado escritor Hanif Kureishi, que ensina Escrita Criativa na Universidade de Kingston, confessou num festival literário, perante um público numeroso, que considera a disciplina uma perda de tempo, que tudo o que conseguiu até agora foi que os alunos escrevessem umas frases boas e bonitas, mas não histórias boas, e que os vê demasiado preocupados com a prosa para poderem escrever um livro interessante. Referiu que 99,9% dos estudantes simplesmente não têm talento literário e que ler o que eles escrevem é tremendamente aborrecido. Outro escritor presente, ex-professor da mesma cadeira, concordou com as suas afirmações e, embora salvaguardando a importância do estilo, assegurou que não se é escritor sem talento e que muitos dos alunos do curso de Escrita Criativa nunca conseguirão passar de escritores medíocres e que é penoso andar a enganá-los no dia-a-dia. E mais: disse que os cursos de escrita criativa se tornaram um negócio em todo o mundo e que há pessoas que frequentam um workshop durante um fim-de-semana e acham que isso basta para se porem a escrever um romance... Enfim, se são os próprios professores a afirmá-lo, quem sou eu para dizer o contrário?