Gripe e futilidade
Tive uma gripe dos diabos na semana passada: febrão, dores no corpo, a garganta arranhada, falta de apetite, enfim, uma incapacidade de ser eu mesma por alguns dias – e, quando digo «eu mesma», estou a falar de uma pessoa que lê habitualmente coisas de jeito. Assim, os dias em casa não puderam ser aproveitados em grandes leituras, os olhos fechando-se ou lacrimejando a maior parte do tempo. Ao fim de quarenta e oito horas melhorei ligeiramente, mas ainda mantinha os sentidos embotados: consegui ler as gordas de um jornal diário sem absorver grande coisa e, percebendo que não valia a pena insistir, tirei do saco de jornais que o Manel trouxe da rua uma revista que, pelos vistos, vem com o El País aos sábados e é dedicada à moda e às mulheres (o Babelia teria de aguardar tempos de maior lucidez). Pois foi uma boa surpresa: embora se trate de material com pouco que ler, a dita revista, chamada S Moda (imagino que o S venha de sábado, mas não tenho a certeza), é um primor em termos de produção e fotografia de moda. Num artigo de fundo sobre os grandes da moda espanhola nos últimos vinte anos (Zara incluída), um conjunto de fotografias protagonizadas por estilistas, sapateiros, joalheiros e modelos arrumados como personagens em cenários belíssimos fez-me lembrar cartazes de bons filmes franceses, italianos e americanos de há décadas, baseados de preferência em bons romances. Uma outra secção, dedicada desta feita a chefs de cozinha, parecia recriar personagens de livros bastante conhecidos – da Recherche à Origem das Espécies, de Tintim às aventuras de Verne. Tenho de confessar que nunca tinha folheado a S, porque ela não costuma sair do saco (tira-se o Babelia e já está), e fiquei impressionada com o aspecto gráfico e a qualidade de impressão. Para a semana, vou ver se a coisa se mantém, se foi tudo um delírio da febre. É que ver arte e literatura numa revista para mulheres pode ser excesso de optimismo ou simplesmente miopia gripal...