Um ou dois séculos, tanto faz?
Comemora-se este ano o bicentenário do nascimento de Charles Dickens, um dos autores com quem decerto aprendi a ler literatura e de que tenho pena que muitos adolescentes deixem passar em branco, porque estou convencida de que é um desses escritores que fazem leitores entre as camadas mais jovens. Tempos Difíceis, David Copperfield ou heróis como o avarento Scrooge de Conto de Natal ficam para sempre pregados à memória de quem os conheceu. A imprensa portuguesa dedicou, bem sei, algumas páginas à efeméride, mas ou as livrarias se fizeram desentendidas ou realmente não tinham as obras para destacar, porque por onde andei não vi nada da festa que Dickens merecia. Este é também o ano do centenário do naufrágio do Titanic, e não sei se o Homem é mesmo mórbido, mas a verdade é que as páginas dos jornais e os documentários sobre o navio chique que chocou contra um icebergue são muitos – e quase adivinho que os livros a mostrarem as loiças, os talheres e todas as outras mariquices a bordo estão por aí a romper para consolarem os que gostam de luxos, mesmo no fundo do mar. Bem sei que a miséria nunca encheu o olho, ainda assim tenho pena do pobre Charles, que se afundou na infância a trabalhar numa fábrica e veio ao de cima a escrever histórias em fascículos com um êxito enorme – e a quem se liga bem menos do que devia.