Idiossincrasias
Todos nós temos manias – é verdade –, uns mais do que outros; mas, se estas nos afectam apenas a nós próprios, que ninguém nos venha criticar por causa delas. (O pior é quando não é assim.) Os escritores não fogem à regra e, por vezes, desenvolvem idiossincrasias que se vão tornando doentias ao longo da carreira. Enquanto decorria, na última Feira do Livro de Lisboa, uma daquelas longas tardes de autógrafos, com as mesas completamente cheias de autores de todos os géneros e idades, estava eu a acompanhar quatro escritores quando fui abordada por uma das colaboradoras da LeYa num tom ciciante. Vinha averiguar se eu, por acaso, tinha uma esferográfica (e nem valia a pena perguntar, porque ando sempre munida de duas ou três, já para evitar que um leitor apareça e os autores não tenham como autografar-lhe o livro). Mas, desta feita, havia uma especificação: a esferográfica tinha de escrever a preto. O autor em causa usa sempre esta cor, e a caneta que tinha levado, quiçá à conta de muitas e longas dedicatórias, dera as últimas. Porém, nem naquela emergência ele aceitava escrever a azul e tinha sido categórico: se ninguém lhe arranjasse uma caneta preta, ir-se-ia embora e não daria mais autógrafos, mesmo que diante da sua mesa engrossasse a fila de pessoas em busca de uma assinatura. Pareceu-me um bocado exagerado pôr tal condição para continuar ali. Talvez estivesse farto e quisesse apenas arranjar pretexto para ir para casa. A sorte foi que, entre as várias canetas que eu trazia na carteira, uma era, de facto, preta. Não ma devolveram até hoje, mas isso até é o menos. Pior teria sido deixar tantos leitores à míngua...