O monge faz o hábito?
Todos conhecem a história do ovo de Colombo – mas ninguém sabe responder se o ovo existiu antes ou depois da galinha. Ora, um dia destes, pensando no Prémio Literário José Saramago por causa da publicação de um novo livro do seu primeiro vencedor – As Filhas, de Paulo José Miranda (que lerei e comentarei oportunamente, assim o tempo mo permita) –, surgiu-me uma questão que se aparenta à do ovo de Colombo. Constatando que este último autor não teve, apesar do galardão, o mesmo destaque dos seus sucessores, perguntei-me porquê, se era evidentemente um bom livro (Natureza Morta) aquele que lhe mereceu a distinção. Com efeito, depois de terem recebido o prémio em causa, os outros autores «abençoados» saltaram para um patamar de visibilidade completamente diferente do que tinham e, regra geral, os seus livros começaram a ser referidos como o que de melhor estava a ser escrito em termos de literatura portuguesa (José Luís Peixoto, valter hugo mãe, Gonçalo M. Tavares, João Tordo). Pareceu-me, pois, relativamente injusto que Paulo José Miranda tenha sido a excepção portuguesa (porque, com os autores brasileiros, é mais fácil perceber porquê) e então ocorreu-me que, se o Prémio Saramago fez muito pelos seus autores, é também possível que os seus vencedores (alguns, pelo menos) tenham feito bastante pelo prémio. Senão, vejamos: José Luís Peixoto (o primeiro autor a conseguir um êxito estrondoso depois de o ter ganho), assim que saiu o seu romance Nenhum Olhar, recebeu elogios de todos os críticos importantes (entre eles, Prado Coelho) e a sua presença em escolas e bibliotecas foi assídua, como então não se usava; o livro chegou a ser finalista do prémio da APE nesse ano (feito raro com um romance de estreia), pelo que, para ele, o Prémio pode ter sido apenas o empurrãozinho que faltava. Também Gonçalo M. Tavares já tinha recebido um outro prémio de relevo quando, no ano seguinte a Peixoto, recebeu o Saramago por Jerusalém (mais tarde igualmente galardoado com o Prémio PT no Brasil), consolidando-se como um dos maiores escritores portugueses actuais. E, a partir destas duas vitórias, o prémio ganhou claramente importância e passou a contribuir claramente, em termos de vendas e visibilidade, para o sucesso dos autores distinguidos – o mesmo acontecendo quiçá a Paulo José Miranda se tivesse concorrido depois, e não antes, de Peixoto e Tavares. Será que, neste caso, o monge também fez o hábito?