Hoje vou falar de um dos melhores livros que li nos últimos tempos (imperdoável não o ter lido antes) e que, se pensar bem, é também um dos livros mais bonitos que li na vida. Chama-se Almas Cinzentas e escreveu-o o francês Phillipe Claudel, tendo com ele arrebatado o Prémio Renaudot (mas merecia todos os outros, que são muitos, em França). E, para além de bonito, é um livro inteligente, com uma particularidade rara, que é a de só sabermos quem é o narrador já a história vai a meio. História triste esta, que parte de uma morte – ainda por cima de uma criança – para contar a vida de uma pequena cidade do Norte de França e dos seus habitantes – o procurador, o juiz, o presidente de Câmara, a professora, o dono do restaurante... – durante a Primeira Guerra Mundial, num cenário quase sempre triste e cinzento, quase sempre frio e miserável, no qual os ricos são sempre os mesmos e os pobres muitos e cheios de medo. Mas há um crime hediondo que é preciso perceber – ainda que alguém já tenha sido condenado por ele à pena capital – e o narrador tem quase a certeza de que o criminoso continua à solta. Por esse crime, perderá ele o pouco que tem, assemelhando-se nisto ao seu adversário, a quem uma jovem e bonita professora chama Tristeza num tom de carinhosa compaixão. Retrato magnífico de um tempo e de um lugar, com personagens muito bem desenhadas, cheias de humanidade, este romance vale cada página que tem; já não é novo e pode ser difícil de encontrar, mas é preciso andar por aí à procura dele porque não há muitos assim, que nos deixem uma pena imensa de chegar à última página.
4 comentários
ASeverino 17.07.2012
Oh Joca "ALMAS CINZENTAS" romance policial, tamos a brincar ou quê...
Almas cinzentas é um livro policial - melhor, de mistério - na senda de outras obras do género, embora tenha mais profundidade do que os vulgares romances do crime, investigação e acusação. É o próprio autor que, numa entrevista, assim o classifica (e não estava a brincar): "Sim, é um romance sobre o mistério e mistérios que nunca se chegam a compreender. Acho que vivemos num mundo em que queremos que tudo seja explicado e não é fácil explicar tudo, ou compreender tudo. Li muitos romances policiais até há dez anos e depois parei, porque cheguei à conclusão que há sempre um culpado, que é apanhado. Acho que por vezes a realidade é mais sombria, mais difusa e menos acessível. Todo o romance é um inquérito sobre um crime, sobre a própria dor do narrador e sobre os homens. Quando escrevo é para compreender os outros." Nessa entrevista, sobre "Almas Cinzentas",o entrevistador pergunta: "As comparações que fazem da sua obra com a de George Simenon incomodam-no?" E ele responde: "Em França os jornalistas gostam muito de fazer comparações. E porquê Simenon? Porque nas primeiras entrevistas que dei, há seis anos, disse que gostava de Simenon. Mas sinto-me próximo de Simenon através dos universos geográficos e de coisas nele que sempre admirei. Encontra sempre palavras e frases muito simples. Uma criança de dez anos pode ler um ‘Simenon’ sem precisar de ir ao dicionário procurar uma palavra. E com essa grande simplicidade aparente foi muito longe." Aqui:(http://portalivros.wordpress.com/2009/03/31/philippe-claudel-entrevista-a-proposito-de-almas-cinzentas/).
Oh amigo Joca não se esqueça que está a falar com um inesclarecido daí esta minha admiração e esta minha "bojarda", mas ALMAS CINZENTAS só será um livro policial se "O HOMEM QUE VIA PASSAR OS COMBOIOS" do Simenon também o for! Mas não sei se por preconceito ou não nem ALMAS CINZENTAS nem O HOMEM QUE VIA PASSAR OS COMBOIOS, dois extraordinários livros, são livros policiais (para mim)! Livro policial para mim só do ROSS PYNN.