Herança genética
Tenho a sorte de ter nascido numa família de leitores. O meu pai era um homem culto e a minha mãe, que nem sequer pôde concluir o liceu, é hoje, aos 88 anos, uma leitora voraz de livros e jornais. Os meus irmãos gostam todos de ler, embora tenham gostos muito distintos, e – não sei se será herança genética –, à excepção de um dos meus sobrinhos, os que já têm idade para ler com regularidade lêem, felizmente, com regularidade. A minha única sobrinha adolescente (os outros já são adultos ou ainda são crianças) começou, de resto, a ler muito cedo os livros da mãe – e papou aos doze ou treze anos obras como O Perfume, de Süskind, ou O Sítio das Coisas Selvagens, de Dave Eggers, que me pareceram leituras talvez demasiado exigentes para a pimpolha que era. Nada contra. Também eu lia os livros da minha irmã mais velha e, só quando a eles voltava noutra idade, percebia aquilo que me passara ao lado. De qualquer modo, nessa montra meio tonta e infantil que é por vezes o Facebook (na qual as pessoas avisam os supostos amigos de que vão ali tomar um cafezinho, que cozinharam bacalhau com batatas – e colocam as fotografias – ou que estão aborrecidas com o patrão), essa minha sobrinha depositou as suas opiniões apaixonadas sobre um livro de Jorge Amado que andava a ler. E eu fiquei orgulhosa e pus lá um «Gosto» e um comentário entusiástico, aconselhando outras obras do autor e falando tu-cá-tu-lá com ela como se andássemos juntas na escola. Espero que o futuro lhe traga muitos livros bons, não a afaste nunca da leitura e, sobretudo, a aproveite bem.