Maturidade
Sempre quis ler Mario Benedetti, um escritor uruguaio nascido em 1920 e tido pelos seus contemporâneos (e não só) como um dos melhores ficcionistas latino-americanos. Como acontece com muitos outros autores que quero ler antes de morrer, não tinha ainda calhado, mas valeu-me um dia destes uma colega editora – a Rosário Alçada Araújo – para que a ocasião se apresentasse e já não fosse possível fugir-lhe. O livro, A Trégua, foi então emprestado e lido de um fôlego. Com mais de cem edições e de um milhão e meio de exemplares vendidos só em língua espanhola, o romance conta a história de um viúvo à beira da reforma que sonha e teme o ócio em doses iguais, depois de ter criado sozinho três filhos que conhece (e o conhecem) bastante mal. Mas eis que, a seis meses de se refastelar num dolce far nienti, aparece no escritório onde trabalha uma rapariga de vinte e quatro anos, Avellaneda, que vai mudar a sua vida e dar um novo alento a uma existência que antes era apenas rotineira e modorrenta. Escrito como um diário, este é um relato de um homem maduro que descobre que ainda tem direito à felicidade e que ganha uma opinião distinta de si próprio à medida que o seu relacionamento amoroso evolui. E, se a narrativa parece mais ou menos linear, a verdade é que o leitor há-de levar às tantas uma estalada na cara, para a qual não houve avisos nem sinais, revelando a mestria de Benedetti num surpreendente volte-face. A única estranheza do romance é que o protagonista tem apenas quarenta e nove anos e é sempre descrito como alguém à beira da velhice – e eu, que já tenho cinquenta e três, enfim, não me sinto tão acabada. O romance é, porém, de 1960 e, pensando bem, nesse tempo em que eu era criança talvez achasse a minha mãe, como dizem os miúdos, uma cota.