Ídolos
Na semana passada, na crónica diária que escreve para o Público, Miguel Esteves Cardoso dizia estar arrependido de não ter conhecido pessoalmente um dos seus ídolos – Samuel Beckett – com quem trocara correspondência e que se oferecera numa dessas cartas para um encontro ao vivo. Não teve coragem, mas, quando soube da morte do dramaturgo, teve uma pena imensa de não ter conversado com ele – e, por isso, incentivava os leitores a não cometerem o mesmo erro se tivessem oportunidade de estar com os respectivos ídolos. Para mim, infelizmente, já não vai dar – porque o escritor que mais admiro, aquele de quem amo cada verso (William Buttler Yeats, poeta irlandês que ganhou o Nobel nos anos 1930), já não está vivo há muito tempo, na verdade morreu muito antes de eu ter sequer nascido. Mesmo assim, sei, por experiência própria, que o convite de Miguel Esteves Cardoso não é isento de riscos, tanto mais que, como editora, tive oportunidade de conhecer pessoalmente muitos autores portugueses e estrangeiros em festivais literários e, em certos casos, quase teria preferido ter-me ficado pela leitura dos seus livros, tão antipáticos eram. Em todo o caso, conheço a excitação que pode provocar estar ao lado de um «grande», seja de que área for, e nunca me conseguirei esquecer da estranha sensação que foi viajar numa carruagem de metro em Londres com Paul McCartney – toda a gente a sussurrar, a apontar, a sorrir, e eu feita parva, a jurar a pés juntos que não, não podia ele. Tenho um amigo que viajou de avião ao longo de sete horas ao lado de uma grande actriz norte-americana e cometeu o mesmo erro; quando se levantou no fim da viagem, arranjou coragem para lhe dizer que ela era mesmo parecida com… Pois, com ela própria! Quando percebeu a oportunidade que perdeu, nunca mais se refez.