Compliquex
Simplificar e aliviar os procedimentos burocráticos e a respectiva linguagem parece-me, em princípio, uma coisa positiva, até porque sempre achei que, em Portugal, se gostava muito de complicar. Há um ano e tal pediram-me que «traduzisse» um artigo da Constituição para que os jovens o pudessem perceber numa redacção mais clara – e, bolas, desculpem-me o palavreado, mas até eu tive dificuldades em compreendê-lo quando o li pela primeira vez. Um dia destes, pousando os olhos num anúncio publicado num jornal, verifiquei que o vício de complicar a prosa se mantinha. O título era este: «Subconcessão da Utilização Privativa do Domínio Público e das áreas Afectas à Concessão Dominial atribuída à Sociedade Estaleiros Navais de Viana do Castelo, S.A.» Bem, claro que quem está interessado já sabe de tudo antes de ler o anúncio, mas, numa frase única, conseguimos ter as palavras «subconcessão» e «concessão», «domínio» e «dominial» (além de que temos «áreas» escrito com minúscula e «Afectas» com maiúscula, o que não percebi); e no corpo do anúncio propriamente dito, de dois parágrafos, lemos coisas como «a subconcessão de […] terreno que integra a concessão dominial concessionada à ENVC». Ui, entre tanta concessão acabei por ficar confusa. Não podiam aplicar aqui o Simplex, ou, pelo menos, escrever mais bonito? Num outro anúncio, posto por uma universidade, o título também era bem estranho: «Procedimento concursal comum para a celebração de um contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo incerto.» Oh diabo, quem é que se lembrou desta formulação tão estranha para uma coisa, afinal, tão simples?