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Horas Extraordinárias

As horas que passamos a ler.

31
Mai13

Viva, pim!

Maria do Rosário Pedreira

Quem teve a sorte de ver representar o actor Mário Viegas, de certezinha absoluta que não mais o esqueceu. A sua interpretação teatral ou cinematográfica era absolutamente genial – e bem assim a forma notável como dizia poesia. Havia um poema emblemático que, na sua boca, fazia parar tudo e deixar-nos pregados ao chão a ouvi-lo. Tratava-se d’O Manifesto Anti-Dantas, de Almada Negreiros («Morra o Dantas, morra. Pim!»), que, para quem não sabe, se atirava ao também poeta Júlio Dantas (que por acaso descobri recentemente ser o autor da letra de um fado de que até gosto bastante chamado Rua do Capelão). Ora, a Assírio & Alvim teve a bela ideia de reeditar o Manifesto num formato muito bonito e com um excelente «brinde»: um CD no qual o próprio Almada lê o seu texto! Suspeito que não consiga suplantar Mário Viegas… em todo o caso, ouvir um poema dito pelo próprio autor, mais ainda tratando-se de Almada, tem outro encanto.

30
Mai13

Rei da poesia

Maria do Rosário Pedreira

 Tenho andado com tanto que fazer que até me esqueci de avisar que, pela segunda vez na história, o Prémio Rainha Sofia de Poesia Ibero-Americana foi atribuído a um português. A única portuguesa que antecedeu o premiado deste ano foi Sophia (que tinha nome de rainha, pelos vistos) e agora o galardão vai para Nuno Júdice, com mais de quarenta anos de livros publicados, entre poesia, ensaio e ficção (o mais recente romance do autor, Implosão, está, de resto, a dar que falar por pôr o dedo na ferida dos tempos que vivemos). Nuno Júdice, já se sabe, é um dos mais consagrados poetas nacionais, um dos mais traduzidos e já premiado internacionalmente várias vezes. Mas desta feita o júri tinha nada mais nada menos do que 18 membros (parece que Lobo Antunes estava entre eles) e elogiou a sua poesia depurada e «o modo como nela se compromete o classicismo, o imaginário e o real» (estou a citar de http://casaldasletras.com, onde poderão encontrar também uma longa entrevista com o poeta laureado). Parabéns, pois, Nuno Júdice, e continue a escrever!

29
Mai13

Cônjuge literário

Maria do Rosário Pedreira

Ser o companheiro pessoal de um grande escritor não é tarefa fácil e, num artigo do Le Monde que me passou a minha colega Maria da Piedade Ferreira um dia destes, a autora, Raphaelle Rérolle, confessa que por vezes se cruza com um destes «cônjuges» nos festivais literários e que eles estão sempre dois passos atrás do escritor com quem vivem, como sombras, privados de identidade própria. No entanto, o seu papel na vida dos criadores pode ser fundamental, como sabemos por vários exemplos conhecidos – e aqui perto de nós, o de Pilar del Río, viúva de José Saramago –, embora, mesmo assim, na maioria do tempo tenham de concorrer com fantasmas e personagens de papel e lutar contra eles por atenção. Cada um destes homens e mulheres terá o seu segredo para sobreviver à fama e ao estrelato do cônjuge, e um deles é tornarem-se assistentes do escritor e gerirem as suas agendas, quando não ocuparem-se até das suas visitas, como se diz que fez toda a vida o marido de Agustina Bessa-Luís, que ia à estação buscar as pessoas que queriam ver e falar com a grande senhora do Porto; e há até quem leve a sua posição de dependência do escritor ao extremo de morrer com ele, como aconteceu à mulher de Stefan Zweig, que se suicidou com o marido em Fevereiro de 1942. Mas a maioria dos companheiros de escritores acabam por passar por cima de muita coisa por considerarem que é, acima de tudo, um privilégio partilharem a vida com um génio, como Maria José de Lancastre, a viúva de Tabucchi, que hoje ocupa os seus dias com o espólio do escritor italiano que, ao que parece, era  bastante desarrumado e nunca vinha para a mesa quando ela o chamava.

28
Mai13

Ler sem obrigação

Maria do Rosário Pedreira

Chamaram-me recentemente aqui no blogue a atenção para um grupo que se chama Voluntários de Leitura – e fui ver o que era (já ouvira falar, mas ainda não tinha tido oportunidade de me debruçar mais detalhadamente sobre o assunto e acho que vale mesmo a pena). Criado em 2012 pela Universidade Nova de Lisboa, este grupo destina-se a potenciar uma rede de voluntários na promoção da leitura, uma vez que, por vezes sem orientação, os jovens se sentem incapazes de ultrapassar as suas dificuldades e facilmente desistem de ler. Sabendo-se que o desenvolvimento da competência da leitura melhora os níveis e os resultados da aprendizagem de qualquer matéria, estes voluntários servem de mediadores e trabalham com crianças e jovens em bibliotecas escolares, ajudando-as a corrigir as suas deficiências de leitura e a ler melhor em todos os sentidos. Têm de ser aceites pelo professor bibliotecário, que os formará e os preparará, apoiando-os depois de forma continuada ao longo do ano. O projecto conta ainda com a participação de outras entidades, como a Fundação Calouste Gulbenkian, o Plano Nacional de Leitura e a Rede de Bibliotecas Públicas, entre outras. Se quiser tornar-se voluntário, contacte o professor-bibliotecário da escola da sua área de residência. Mais informações no link abaixo.

 

http://www.rbe.min-edu.pt/np4/750.html

27
Mai13

A Colômbia gosta de ler

Maria do Rosário Pedreira

Há pouco tempo, realizou-se em Bogotá uma feira do livro que tinha Portugal como país convidado e por onde passaram quase meio milhão de pessoas (incluindo Cavaco Silva, que se esqueceu de mencionar Saramago no seu discurso, como se um Nobel – sobretudo quando não se tem senão um – fosse coisa de somenos). Os escritores e jornalistas portugueses convidados para o certame vinham, na sua maioria, muito agradavelmente surpreendidos com o interesse e a curiosidade dos colombianos pela literatura portuguesa, enchendo os auditórios, querendo ouvir falar a língua, comprando livros, encontrando-se pessoalmente com alguns autores. Lembro-me de que, nas Correntes d’Escritas, sempre que vinham autores colombianos, os seus discursos eram muito acima da média; e um deles contou-me que, na Colômbia, a retórica e a oratória fazem parte das disciplinas curriculares de muitos cursos, não podendo nunca um deputado ler um discurso no Parlamento. Mas o que eu não sabia é que este país considera os hábitos de leitura imprescindíveis e que o seu governo, quando entrega aos mais desfavorecidos habitações sociais, além do mobiliário indispensável oferece uma estante recheada de clássicos. Uma belíssima ideia, cá para mim.

24
Mai13

Poeta da voz

Maria do Rosário Pedreira

Recentemente, comemorou-se o centenário do nascimento do actor João Villaret. Os extraordinários leitores deste blogue que são da minha geração ou mais velhos não deixarão de recordar o grande declamador de poesia que era – eu fiquei necessariamente marcada pela sua forma generosa de dizer os outros (e a minha recordação mais firme prende-se com José Régio, poeta de que nem gosto assim tanto, mas isso parecia nem importar, de tal forma aquela voz e forma de dizer eram cativantes). Passava-se tudo num pequeno ecrã de televisão a preto e branco: acompanhado pelo seu irmão Carlos ao piano, Villaret lia magistralmente textos de poetas portugueses – Botto, Sá-Carneiro, Pessoa, Camões, Guerra Junqueiro, entre muitos outros; essas leituras foram gravadas em vídeo com o título um pouco coxo de «Vídeos RTP» e vendidas em cassette. Sendo 2013 o centenário de Villaret, mereciam agora uma edição em DVD para os que apenas ouviram falar deste homem, mas não puderam vê-lo e ouvi-lo, poderem tomar contacto com a sua voz e representação. A jornalista Maria Augusta Silva recupera, no link abaixo, uma das «exibições» do grande diseur, que morreu com apenas 48 anos.

 

http://www.casaldasletras.com/maria_Arte_plural.html

23
Mai13

É p’ró menino e p’rá menina

Maria do Rosário Pedreira

Hum... adoro feiras – mais ainda se forem do livro, que são praticamente os únicos lugares onde arranjamos livros que não se encontram em mais parte nenhuma e quantas vezes com descontos apreciáveis (o que se torna ainda mais importante na época de escassez financeira que estamos a atravessar). É já hoje que se inaugura a Feira do Livro de Lisboa, no Parque Eduardo VII, que voltou a realizar-se nas datas habituais (em Maio, e não em Abril, como nos últimos dois anos), permitindo a quem quer ver e comprar livros aliar esse seu interesse à possibilidade de uma passeata soalheira ao ar livre entre as árvores (imagino que estejam já floridos os jacarandás do parque). Para além dos pavilhões recheados de «iguarias», também lá estarão, como sempre, os grandes «cozinheiros», pondo a assinatura nas obras que o público lhes estende e dando dois dedos de conversa com os leitores se as filas não crescerem muito (o que, dada a situação de crise, não é muito natural que aconteça). Assim, já sabe: se quiser um autógrafo personalizado ou conhecer os rostos por detrás das capas, o fim-de-semana é o momento mais aconselhável. Se só quer mesmo ver e comprar, escolha um dia de semana e ficará mais bem servido. No próximo sábado, o último galardoado com o Prémio LeYa assinará também a programação da Praça LeYa, na qual haverá música e teatro da sua eleição. Se mora em Lisboa, não falte! Até porque, como em todas as feiras, há farturas.

22
Mai13

O génio infantil

Maria do Rosário Pedreira

Na infância já é possível entrever quem, de entre os alunos de uma turma, se afigura mais criativo, seja pelos desenhos que se distinguem dos que são clássicos entre crianças, seja através de redacções imaginativas, tiradas intempestivas ou até perguntas formuladas do avesso. Uma amiga enviou-me há uns tempos por e-mail um conjunto de definições que um grupo de crianças avançou – e é, de facto, notável como já é possível, por ali, encontrar uma veia poética ou uma bela dose de criatividade. Para mim, a melhor era de longe a definição de «rede»: «Uma porção de buracos amarrados por um cordel.» Mas também me deliciei quando um rapazinho disse que um relâmpago era «um barulho rabiscando o céu» e outro classificou o calcanhar como «o queixo do pé». À pergunta «O que é um palhaço?», uma menina respondeu que era «um homem todo pintado de piadas». Outra definiu vento como «ar cheio de pressa». No campo dos animais, uma criança disse que cobra era «um bicho que só tinha rabo» e, com imensa propriedade, outra avançou que uma avestruz era «a girafa dos passarinhos». Enfim, vamos ver se, daqui por uns anitos, mantêm a inventividade ou se deixam estragar pelo caminho... Pode ser que algum deles se torne um original escritor.

21
Mai13

Tanto mar

Maria do Rosário Pedreira

Hoje será o lançamento de mais um dos romances finalistas do Prémio Leya, recentemente entregue a Nuno Camarneiro. Trata-se de Que Importa a Fúria do Mar, de Ana Margarida de Carvalho, uma excelente surpresa se pensarmos que é uma estreia na ficção (embora, de algum modo, não estivéssemos à espera de menos da grande jornalista que é a autora). Colocando duas gerações frente a frente – um homem que foi operário vidreiro no antigo regime e uma jornalista nascida provavelmente depois do 25 de Abril que tem de o entrevistar e cria, a partir daí, um estranho relacionamento com ele –, o romance combina afinidades com diferenças, infâncias terríveis com memórias peculiares do mar, decepções e alegrias com amores impossíveis. O escritor Afonso Cruz fará a apresentação na Livraria Buchholz, às 18h30, onde estará igualmente o actor e encenador Miguel Seabra para ler excertos e a cantora lírica Ana Maria Pinto para nos brindar com Maio, Maduro Maio, de Zeca Afonso, a canção donde foi retirado o título do livro. Apareçam.

 

20
Mai13

Road novel mas não só

Maria do Rosário Pedreira

Francisco Camacho estreou-se na ficção com um romance notável intitulado Niassa, que convocou o aplauso da crítica e arrecadou o Prémio do PEN para Primeira Obra no ano em que foi lançado. Fez uma pausa algo demorada, mas regressa agora com uma road novel singular e fascinante que suspeito venha a ter um destino semelhante à anterior. Chama-se A Última Canção da Noite e traz à cena duas personagens masculinas inesquecíveis: o guitarrista britânico Jack Novak, que era a alma de uma banda de sucesso e despareceu na Roménia durante uma tournée em condições misteriosas, dando origem a muita especulação; e o crítico de música português caído em desgraça David Almodôvar, que foi vítima de uma acusação de plágio (de que não se conseguiu defender decentemente), do desemprego que essa circunstância acabou por provocar (era a estrela de uma agência de publicidade) e de uma história de amor que se interrompeu quando o romance começa – com a existência de uma carta deixada pela mulher com quem vivia, Vera, que constitui mais um desafio do que uma declaração de abandono. Os dois homens acabarão por juntar-se e tornar-se cúmplices durante uma viagem a Marrocos, na qual os leitores serão ajudados a desvendar os mistérios criados pelo romancista, com a promessa de grandes surpresas que passam até por uma guerra que encheu as parangonas dos jornais não faz muito tempo. E eu também prometo umas horas muito bem passadas com A Última Canção da Noite, um romance com diálogos admiráveis, muito cinematográfico, de que se podia fazer por acaso um grande filme. A ler, absolutamente.

 


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