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Horas Extraordinárias

As horas que passamos a ler.

31
Jan17

Em Belém

Maria do Rosário Pedreira

Isabel Alçada – ex-ministra da Educação, escritora e fundadora do Plano Nacional de Leitura (PNL) – trabalha agora com o Presidente da República na área da Educação e montou, para alegria de Marcelo (que sempre gostou de livros), um programa que junta leitores e autores no Palácio de Belém uma vez por semana. À terça-feira, dois grupos de alunos de vários níveis de ensino de mais de 250 escolas públicas vão ter, assim, oportunidade de visitar a casa oficial do Presidente e falar com um determinado escritor (mais de 60 foram convidados) sobre a respectiva obra. (O escritor que tem, naturalmente, livros no PNL, ou seja, cuja leitura é já aconselhada). Os autores variam muito e podem produzir obra infantil – como António Torrado ou Alice Vieira, por exemplo – ou para adultos – como Afonso Cruz ou Valter Hugo Mãe – até porque, entre os estudantes que compõem as turmas do Secundário, já haverá quem leia como gente grande. E é suposto – em qualquer que seja o grau de ensino – os professores trabalharem na escola com os seus alunos os livros dos escritores com quem se encontrarão em Belém, para que as sessões sejam mais interessantes e os próprios escritores esclareçam dúvidas e matem a curiosidade aos seus interlocutores. De caminho, já se sabe, há sempre a possibilidade de tirar uma selfie com o Presidente.

30
Jan17

Contra-sensos

Maria do Rosário Pedreira

Li um dia destes no Diário de Notícias que o primeiro livro de Hergé da série Tintim – Tintim no País dos Sovietes –, que até agora só existia na sua versão original, a preto e branco, vai ser finalmente colorido. Mas talvez o país dos Sovietes fosse mesmo um bocadinho cinzentão e as cores agora não respeitem esse mundo obscuro... Espero pela publicação para ver se pintar o livro não será um contra-senso; mas, por falar em Sovietes, lembrei-me de que recentemente o semanário Expresso começou a oferecer em pequenos fascículos uma biografia de Estaline da autoria de Simon Sebag Montefiore, biografia que já tinha sido publicada entre nós num único volume bastante gordo. Exclusivamente para a edição oferecida com o jornal, pediram um prefácio a Francisco Louçã, o que, estou convencida, enriquece a obra; porém, segundo o Manel, que já o leu, o prefaciador não poupa nas críticas à tradução do livro... Não será então um contra-senso oferecê-lo aos leitores tal como estava, não ter aproveitado os reparos para fazer uma boa revisão? É que, mesmo que algumas pessoas não dessem pela calamidade, ficam logo avisadas de que o que têm na mão vem com defeito...

 

27
Jan17

A palavra intraduzível

Maria do Rosário Pedreira

Nós, portugueses, costumamos dizer que temos uma palavra intraduzível: saudade. Não é a mesma coisa que nostalgia (palavra quase igual em muitas línguas) e exprime um sentimento de tristeza pela ausência de alguém. Um dia destes, perguntei-me se “saudade” teria a mesma origem de “saudar” (são tão próximas) e pensei que, no fundo, a saudade talvez significasse um desgosto por não poder cumprimentar alguém que está longe. Mas não: ao que apurei, “saudar” vem de saúde, pelo que ainda hoje os espanhóis se despedem nas cartas com “saludos” e os italianos com “saluti”, querendo no fundo dizer que desejam que os outros estejam ou fiquem bem de saúde, tal como César dizia “salve” e, ao batermos os copos para um brinde, fazemos nós mesmos uma “saúde”. A saudade vem do latim (solitus+atis, uma espécie de solidão, uma vez que solus significa “a um”, ou seja, sozinho). É por o outro se encontrar longe que estamos sozinhos e sentimos a sua falta, expressão que em inglês e francês é mais directa (“I miss you”, sinto a tua falta; “tu me manques”, faltas-me); em espanhol, o correspondente a “tenho saudades tuas” é “te extraño”, que não pode traduzir-se por “estranho-te”, mas que é um pouco o avesso do que se “entranha”, isto é, o que está afastado. Franceses e espanhóis passam o ónus do desgosto para quem falta, nós e os ingleses assumimos a nossa própria solidão. Saúde para todos!

26
Jan17

Obama Leitor

Maria do Rosário Pedreira

Numa entrevista concedida ao New York Times uma semana antes de deixar a Casa Branca, Obama declarou que os livros o ajudaram muito a sobreviver aos oito anos da presidência e que, aliás, sempre desempenharam um papel fundamental na sua vida desde a juventude, em que os levava nos seus passeios, ensinando-o a perceber quem era e quais eram, realmente, as suas ideias. Nos oito anos em que foi presidente dos Estados Unidos, nunca se afastou da leitura, considerando os livros uma excelente fonte de inspiração sobre as complexidades e ambiguidades da condição humana, bem como uma forma de abrandar  da confusão da vida política e ganhar distanciamento e perspectiva sobre as coisas, para poder pensar melhor e ter o equilíbrio necessário no momento de tomar decisões. Os escritos de Martin Luther King, Gandhi e Nelson Mandela foram, nessa medida, de grande utilidade, bem como as biografias de outros presidentes dos EUA. Mas Obama também confessa ter lido vários livros de ficção narrativa como escape, e inclui na sua lista obras de Roth, Bellow e V. S. Naipaul, mas também Junot Díaz e Jhumpa Lahiri, Marilynne Robinson, David Eggers e Zadie Smith. Ao novo presidente, acho melhor nem perguntarem o que anda a ler…

25
Jan17

Subserviência ou medo

Maria do Rosário Pedreira

Leio no The Guardian a notícia de que a Prémio Nobel da Literatura Svetlana Alexievich e mais de trinta outros escritores, entre os quais o autor de policiais de sucesso internacional Boris Akunin e o poeta Lev Rubinstein, deixam o PEN Club da Rússia, reagindo à expulsão de Parkhomenko, membro do staff e acusado de ser um provocador e querer destruir a instituição a partir do seu interior. Ao que parece, Parkhomenko, destituído pelos 15 membros da administração do PEN russo, não gostou que os colegas recusassem o seu pedido de apoio ao cineasta ucraniano Oleg Sentsov, a cumprir uma pena de 20 anos de prisão decretada pelo tribunal da Rússia por «actividades terroristas», e acusou no Facebook o mesmo PEN de não cumprir a obrigação de defender e promover a liberdade de expressão, como fazem todos os outros PEN em diferentes lugares do mundo. Svetlana Alexievich, na carta em que comunica o seu afastamento da organização, alerta para o facto de nos anos da Perestroika o PEN ter sido motivo de orgulho para os escritores russos, mas sublinha que agora a instituição os envergonha pela subserviência ao poder, o que só tinha acontecido – et pour cause – durante o estalinismo. E acrescenta que, um dia, Putin partirá, mas que esta triste página do PEN ficará gravada para sempre na memória de todos… Os escritores, é verdade, poderão até imortalizá-la.

24
Jan17

O balanço das mortes

Maria do Rosário Pedreira

O final do ano é sempre época de balanço – e os nossos jornais fazem por publicar as listas do que de melhor houve em termos de livros, filmes, álbuns de música, peças de teatro e exposições. E, logo que o novo ano se inicia, afadigam-se então quase sempre os mesmos jornalistas a anunciar as novidades que estarão em lojas, museus e salas de espectáculos durante o primeiro trimestre. Este mês de Janeiro, porém, houve um jornalista (Nuno Pacheco, do jornal Público) que fez um artigo contra a corrente e, quiçá «aproveitando» a partida de Mário Soares, escreveu sobre várias outras despedidas – ou seja, fez o balanço das mortes de artistas e outras personalidades que ocorreram em 2016, deixando-nos a todos mais pobres. Foi, como ele disse, um ano muito duro – e só na parte que mais toca este blogue, a dos livros, os óbitos foram muitos. Morreram autores de diversas áreas: Alvin Toffler, o autor do profético A Terceira Vaga (lembro-me bem do sucesso deste livro) e Elie Wiesel, o activista judeu que sobreviveu aos campos de concentração e acabaria por receber o Nobel da Paz; outros dois escritores que tiveram o mesmo galardão, mas na Literatura: o italiano Dario Fo e o húngaro Imre Kertész; a senhora que escreveu Não Matem a Cotovia, Harper Lee; o grandíssimo Umberto Eco, escritor plural; uma das três Marias, Isabel Barreno; o poeta brasileiro Ferreira Gullar, vencedor do Prémio Camões em 2010; Michel Tournier, autor de, por exemplo, Sexta-Feira ou a Vida Selvagem; o autor da famosa peça Quem Tem Medo de Virgina Woolf, Edward Albee; Lars Gustafsson, que escreveu o belíssimo A Morte de Um Apicultor; e mais meia dúzia de pessoas que se dedicaram à escrita em vários países do mundo. Ufa! Espero que 2017 não nos leve tantos.

23
Jan17

Rádio ao vivo

Maria do Rosário Pedreira

Já há vários anos que é possível assistir ao vivo à gravação do programa de rádio Ensaio Geral, da autoria de Maria João Costa, da Rádio Renascença, que acontece uma vez por mês na Livraria Férin, em Lisboa. Mas a jornalista associou-se recentemente a João Paulo Cotrim (entre outras coisas, o editor da Abysmo) para a realização de um outro programa radiofónico intitulado Obra Aberta, estreado no dia 12 de Janeiro na Sala Glicínia Quartim do Centro Cultural de Belém, às 18h00, e igualmente aberto ao público interessado (e igualmente emitido na Renascença). A ideia é juntar um escritor a um leitor na mesma mesa – na estreia Frederico Lourenço, galardoado com o Prémio Pessoa, e António de Castro Caeiro – e fazê-los falar dos livros que leram, dos autores de que gostam, das personagens que os marcaram, abrindo os livros ali mesmo, diante do público, e explicando os porquês. Não consegui ir, infelizmente, a este programa inicial, mas no dia 26 de Janeiro (a Obra Aberta é quinzenal) será a vez de António Mega Ferreira (escritor) e João Queiroz (leitor) dividirem o tempo entre páginas e quem sabe consigo sair  do trabalho a tempo de estar às seis da tarde em Belém… A coisa promete.

20
Jan17

Domínio público espanhol

Maria do Rosário Pedreira

Todos os anos entram no domínio público as obras de um certo número de escritores. Que quer isto dizer? Que, decorridos 70 anos sobre a morte de um autor, os direitos deixam de ser devidos aos herdeiros, e qualquer editor em qualquer parte do mundo pode publicar a obra livre deste encargo (podem até publicá-la vários editores ao mesmo tempo, como acontece, por exemplo, com O Principezinho, de Saint-Exupéry, com várias edições portuguesas desde que entrou no domínio público). Ora, ao que leio num blogue, em Espanha estes 70 anos só vigoram para autores que morreram depois de 1987, mantendo-se para os que perderam a vida antes disso o período de 80 anos antes estabelecido. Razão pela qual este ano de 2017, no país vizinho, entra no domínio público a obra dos escritores mortos em 1936 – e não em 1946, como acontece em Portugal. E, porém, se este atraso de dez anos parecia uma desvantagem, não o é realmente. Porquê? Porque 1936 é o ano em que começa a Guerra Civil de Espanha e, como toda a gente sabe, esta provocou, sobretudo entre os intelectuais, muitíssimas vítimas e mortes violentas (ocorre-me desde logo García Lorca, que morreu justamente neste ano). A Biblioteca Nacional de Espanha disponibiliza uma lista com mais de 300 nomes e 77 páginas! Nela, descubro Miguel de Unamuno e Ramón del Valle-Inclán, por exemplo, outros dois nomes importantes. Mas muitos mais haverá nessa lista ceifados pelo franquismo. Para quem a queira «folhear», deixo o link.

 

http://www.bne.es/webdocs/Servicios/Informacion_bibliografica/autores-dominio-publico-2017.pdf

19
Jan17

Detroit-Figueira-Lisboa

Maria do Rosário Pedreira

Como já vem sendo hábito, a Biblioteca da Figueira da Foz organiza sessões mensais, às 21h30 de uma quinta-feira, sobre autores e livros específicos, em que os escritores podem conversar com o público sobre a sua mais recente produção e responder a perguntas do moderador, o também romancista António Tavares, que tem, entre outros, o pelouro da Cultura na Câmara figueirense. Hoje à noite, será a vez de João Ricardo Pedro e do seu romance O Postal de Detroit, publicado em Abril de 2016; e lá estarei com ele nuns confortáveis sofás de couro preto para fazer uma pequena introdução à obra e lançar algumas questões para abrir o diálogo. Vai ser divertido sentar-me entre dois galardoados com o Prémio LeYa, já que não só João Ricardo Pedro o venceu em 2011 com O Teu Rosto Será o Último, que atingiu números de venda espectaculares para um romance de estreia e foi traduzido em cerca de uma dezena de países, mas também o próprio moderador viu o seu romance O Coro dos Defuntos contemplado em final de 2015 com esse mesmo prémio. A seguir ao encontro, há chá de limonete e bolinhos para convidados e público, o que é bom, pois a seguir temos de conduzir até Lisboa e é bom levarmos o estômago aconchegado. Apareça!

CARTAZ JOÃO RICARDO PEDRO.jpg

 

18
Jan17

Uma boa história

Maria do Rosário Pedreira

Uma aldeia situada a cerca de trinta e cinco quilómetros de Burgos saltou do anonimato para as parangonas dos jornais do país vizinho. É um lugar chamado Quintanalara, de apenas quatro ruas, casas de pedra de um só piso e, segundo o censo, uns míseros 33 habitantes (embora só nove vivam lá durante todo o ano). E, porém, ao contrário de aldeias e vilas de outra dimensão, acaba de construir uma biblioteca, e uma biblioteca de 16 000 volumes! Estes foram doados, na maioria, por particulares que herdaram bibliotecas de família que não cabiam nas suas casas, mas também por universidades, como a de Navarra, que se apaixonou pela iniciativa e mandou um camião cheio de livros. E o que é espantoso é que esta biblioteca, estando no meio rural, fica aberta dia e noite (sim, vinte e quatro horas por dia!) e não é um lugar de empréstimo, mas de troca: quem lá for buscar um livro tem de deixar outro, para que o número de volumes não diminua (a biblioteca está, de resto, incluída na rede de bookcrossing como um dos pontos de troca de livros mais bem apetrechados). Os responsáveis crêem que este pequeno templo milagroso atrairá pessoas a Quintanalara e projectam realizar ali conferências e apresentações de livros, não apenas para os habitantes locais (que não encheriam a sala) mas para gente das terras das redondezas que não têm grande oferta e para turistas e gente que ficou curiosa com a notícia. Propõem, aliás, o plano ideal para um fim-de-semana: visitar o património românico da zona e terminar o passeio na biblioteca, com uma boa história! Não sei porquê, mas já me estou a ver a ir a Quintanalara…

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