Por decisão unânime do júri, O Século dos Prodígios, de Onésimo Teotónio Almeida (Quetzal), ganhou o Prémio Mariano Gago, promovido pela Sociedade Portuguesa de Autores. O Prémio Mariano Gago visa distinguir o melhor livro de divulgação científica publicado no ano anterior. Este livro já tinha sido galardoado com o Prémio Fundação Gulbenkian / História da Presença de Portugal no Mundo (atribuído pela Academia Portuguesa de História) e com o Prémio D. Diniz, da Casa de Mateus. Parabéns ao autor!
As estatísticas dizem que em quase todos os países se perderam leitores com a concorrência dos jogos, dos telemóveis e das séries, e é natural que alguns bibliotecários tenham hoje menos que fazer e precisem de se distrair com qualquer coisa ao longo do seu dia de trabalho. Um bibliotecário canadiano resolveu, então, começar a postar na sua página de Instagram fotos de capas de livros e DVD com títulos esquisitos; e, ao que parece, entre ficção e não-ficção, já vai em mais de 200 só no último ano. Alguns são mesmo intraduzíveis (porque perdem a graça toda sem os trocadilhos do original), como, por exemplo, Murder by Milkshake; mas há outros que são bizarros em qualquer língua (Please God Let it Be Herpes ou Team Dance: a Guide to Canine Free Style...), fazendo-nos pensar em quem serão os autores por detrás de tais obras. Ninguém sabe quem é este bibliotecário que assina apenas VPLGold (VPL corresponde a Vancouver Public Library) mas ele anda a desenterrar «tesouros» das estantes da biblioteca todos os dias. Enfim, não deve ter muito que fazer...
Jaime Bulhosa está ligado aos livros pelo cordão umbilical (passe a metáfora, porque era o pai, e não a mãe, quem o levava desde criança às livrarias) e foi, durante muito tempo, um livreiro independente, primeiro na Livraria Bulhosa de Entrecampos, onde fiz muitíssimos lançamentos nos melhores tempos da edição, e depois na Pó dos Livros, que, infelizmente, fez tudo para se manter no mercado, incluindo arranjar aos clientes livros muito difíceis de encontrar, mas, dada a conjuntura actual, não conseguiu e fechou portas há cerca de um ano. Jaime Bulhosa alimentou um blogue, no qual contava coisas cómicas sobre perguntas e pedidos absurdos ou engraçados de clientes – e agora reuniu os seus posts e outros textos no livro Pedra de Afiar Livros e Outras Histórias de Um Livreiro, da Oficina do Livro, que deve ser lido, até porque é um testemunho muito interessante sobre os dias que atravessamos. Há um bonito vídeo sobre este livro (link abaixo), que aconselho a todos; e, além disso, o autor vai estar hoje na Livraria Menina e Moça, em Lisboa, às 18h30, para falar com os leitores.
Não escrevi «fitas» a pensar em «cenas», mas a verdade é que também se aplica essa acepção à presente história. Na Queima das Fitas da Universidade de Coimbra, um grupo de estudantes de História (o curso é importante para o enredo) resolveram que o seu carro alegórico se chamaria, calculem, Alchoolocausto (!?). Enfim, na Direcção da Faculdade de Letras houve alguém sensato que, graças a Deus, chegou a acordo com as criaturas para evitar tal ofensa à dignidade humana e à memória do Holocausto; mas nem era preciso muita inteligência ou cultura para os jovens perceberem que de facto estavam a exorbitar. No entanto, os «fitados de História», em vez de aceitarem que se tinham precipitado, ficaram tão aborrecidos por não aproveitaram aquilo que achavam um nome bestial que resolveram falar de «policiamento académico» e «censura» (ver, por exemplo, a imagem abaixo). Então, 71 professores da Faculdade de Letras fizeram uma carta a demarcar-se de tais atitudes e a explicar o que realmente se passou, em que se acrescenta que, num folheto que os mesmos estudantes teriam feito no dia da memória do Holocausto (27 de Janeiro), falava-se de um extermínio «com o intuito de desembaraçar a sociedade alemã e a Europa de inúmeras comunidades sociais», frase que os professores consideram ou revelar ignorância pura e dura (o que é grave em alunos que estudam História), ou indisponibilidade total para referir com rigor os factos. Enfim, prefiro pensar que é ignorância (até porque estou sempre a ver casos semelhantes noutros contextos); mas, de «fitados» em História, esperavam-se realmente cenas mais informadas...
Bem sei que o Dia da Mãe já lá vai há mais de uma semana, mas dei comigo a pensar nele porque, de repente, parece que a Mãe se tornou tema de uma data de livros que saíram quase ao mesmo tempo ou, pelo menos, nos últimos meses. Falo de uma colectânea de poesia (a primeira, de resto) do editor e escritor americano John Freeman (o senhor que dirigiu a revista Granta e a tornou ainda mais famosa no mundo inteiro) intitulada Mapas (Tinta-da-China), que versa o luto materno, também ponto de partida de dois outros livros: Em Tudo Havia Beleza, romance de Manuel Vilas (Alfaguara) que vendeu milhares de exemplares no país vizinho com o título Ordesa (a montanha aonde o autor ia com os pais) e Filho da Mãe, de Hugo Gonçalves (Companhia das Letras), que é um texto semiautobiográfico. Além destes, descubro ainda o livro Mães Que Tudo, de contos (Companhia das Letras), em que escrevem apenas mulheres. A mãe (salvo seja) posta a render pode dar bons resultados. Os lucros serão nossos, claro.
Já votou na sua livraria preferida? Pois bem, a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) promove uma vez mais este concurso e é importante votarmos naqueles que fazem a diferença, sobretudo num país em que as livrarias independentes tendem a desaparecer. O link aqui vai. Vote bem.
Uma das vantagens de ler um jornal discreto como The Guardian é o facto de os seus jornalistas andarem sempre em cima do acontecimento. Em tempo de fake news, sinto-me confiante neste diário britânico, que foi e é bastante rigoroso. E, de resto, veio agora denunciar uma situação típica da esperteza saloia da Amazon. Ora, parece que os compradores da livraria virtual têm sido enganados constantemente com críticas a determinados livros que, efectivamente, não correspondem à edição que está à venda. Pensem por exemplo num clássico de Tolstoi ou Dostoievski. Claro que é o tipo de obra que merece habitualmente elogios, quer de académicos conceituados, quer de leitores comuns. Mas imaginem que existem edições destes clássicos que, por acaso, foram truncadas, estão mal traduzidas, mal prefaciadas, têm notas de rodapé ridículas, enfim, há muitas coisas que podem transformar uma jóia numa pedra sem valor. E colocar as boas críticas ao pé destas edições más para as despachar é, diria eu, coisa de má-fé e artimanha para despachar livros. Ainda bem que alguém viu e denunciou. Obrigada ao Guardian. Temos de estar mais atentos como compradores porque existe muita gente que nos quer ludibriar. Outra espécie de fake news, em suma.
À medida que vamos envelhecendo, o tempo parece andar mais e mais depressa. Esta semana fiz anos de casada (nem digo quantos para não me assustar outra vez) e este blogue fez nove anos no domingo passado (já?!). No final da década de 1990 publiquei um livro que dizia que, nos cinquenta anos anteriores, o mundo mudara mais do que nos quinhentos anos anteriores (ou seja, tudo o que aconteceu nos primeiros 450 foi calmo e pausado e logo a seguir a coisa disparou e chegámos aonde chegámos, sem conseguir tempo para nada). Era um livro de Bill Gates e chamava-se, se não me engano, Negócios à velocidade do Pensamento. Claro que já não está disponível nas nossas livrarias. Em relação a coisas velhas, descobri este recorte engraçadíssimo que vêem abaixo. Mas não se iludam: os que têm a minha idade ainda se lembram de que a lei vigorou até quase ao 25 de Abril, mesmo que ninguém a cumprisse. E pensar que eu ainda fui contemporânea destas regras é perceber que o tempo realmente voa...
Dizem que os miúdos da escola secundária não acertam em transcrições do texto pedidas nos testes pelos professores porque simplesmente não sabem o que quer dizer «transcrever»… Bem, espero que aqui no blogue ninguém tenha dúvidas sobre a palavra e que os mais disponíveis possam abraçar voluntariamente o pedido de transcrever cartas para um projecto que dá pelo nome de Cartas da Natureza. Não pensem logo em coscuvilhice amorosa e em envelopes com pétalas de flores perfumadas, embora por acaso haja plantas e flores implicadas nisto. É que a correspondência histórica que se pretende ver passada a computador é, nem mais nem menos, a que foi dirigida ao Jardim Botânico da Universidade de Coimbra entre 1870 e 1928 por leigos e especialistas, tantas vezes acompanhada por desenhos feitos à mão e caligrafia estupenda, com esclarecimentos, perguntas e dúvidas sobre espécimes. Pois bem: apesar de muito do material estar já digitalizado, era importante extrair o texto dessas cartas fotografadas e reproduzi-lo em caracteres digitais para que possa ser servir melhor os interesses de estrangeiros que visitam a Biblioteca Digital Botânica e de todos os que têm dificuldade em decifrar algumas letras. Ao transcrever os documentos, o copista vai de certeza ganhar um sem-número de informações novas e deliciosas, além de, como podem calcular, dramas e episódios pessoais bastante inspiradores. Quem me dera ter tempo…
Almeida Garrett nasceu numa casa do Porto que foi recentemente objecto de notícia nos jornais e televisões portugueses pelos piores motivos: houve nela um incêndio de grandes proporções que destruiu totalmente o interior, apesar de se ter conseguido salvar a bonita fachada (mesmo que enegrecida). Não se sabe ainda o que aconteceu, mas suspeita-se de que tenha havido vandalismo ou descuido. Ao que li, a Câmara do Porto tinha a intenção de comprar o edifício (para fazer uma Casa-Museu?), mas parece que ainda não tinha feito propostas concretas ao proprietário, e a Polícia Judiciária exclui à partida que o fogo tenha que ver com especulação imobiliária. Mas a verdade é que João Baptista da Silva Leitão Almeida Garrett, o escritor muitíssimo janota que se casou com uma rapariguinha mal saída da puberdade, pugnou pela construção do Teatro Nacional D. Maria II e escreveu, entre outras coisas, as memoráveis Viagens na Minha Terra (obra que dividiu muitos estudantes da minha geração: uns gostavam dos apontamentos de viagem, outros só liam a história de amor entre a Joaninha e o Carlos), está, depois de morto, desalojado… É que, em Lisboa, a casa onde viveu no bairro de Campo de Ourique, depois de grande polémica aqui há uns anos, também foi deitada abaixo para, no seu lugar, ser construído um complexo de luxo… Pobre Garrett, que merecia um museu, mas não me parece que o vá ter… Mais uma folha caída.