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Horas Extraordinárias

As horas que passamos a ler.

31
Mar25

Lusitânia

Maria do Rosário Pedreira

Sei que, ao longo de muitos anos, um colega meu editor de banda desenhada, o Vítor Silva Mota, tentou tudo por tudo para que uma das histórias de Astérix passasse aqui pela terrinha. E não é que conseguiu? Acabo de ler na newsletter da LeYa que, em finais de Outubro próximo, iremos publicar mais um volume (o 41º) da incrível série Astérix (originalmente da dupla Goscinny- Uderzo) que se intitula, vejam lá, Astérix na Lusitânia! Caramba... que honra termos o gaulês a pisar a calçada portuguesa, ou seja, o chão do extremo ocidental do Império Romano, onde, já sabemos, a comida é boa (sorte do Obélix) e os seus habitantes generosos. Vai tudo correr bem, suponho, embora os novos autores (Fabcaro e Didier Conrad) talvez não estejam assim tão seguros, até porque os romanos... são loucos! Preparem-se: um Astérix em Portugal é coisa nunca vista.

28
Mar25

Livros e livrinhos

Maria do Rosário Pedreira

Se Março é o mês da poesia, vem aí o mês dos livros. Em 23 de Abril, data de nascimento de Cervantes e Shakespeare, celebra-se o Dia Mundial do Livro (que em Espanha é também conhecido por dia de São Jorge, em que nas ruas se espalham tendas e barraquinhas com livros e se oferecem rosas nas livrarias). Mas é já no dia 2 que se celebra o Dia do Livro Infantil (daí eu ter escrito «livrinhos» no título deste post), e este ano a DGLAB (Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas) escolheu a talentosíssima Rachel Caiano para fazer o cartaz celebrativo, seguindo uma tradição que já tem 20 anos. Esse novo cartaz (que partilho abaixo) e todos os outros dos anos anteriores vão estar juntos numa exposição intitulada Ler é ser livre, que se inaugura nesse mesmo dia 2 de Abril às 17h30 na Torre do Tombo e ficará aberta ao público até final de Maio. Para mostrar que, em termos de ilustração, Portugal dá cartas e tem grandes artistas. Vamos ver?

 

Dia do Livro Infantil.png

27
Mar25

Para sempre

Maria do Rosário Pedreira

Recebo um e-mail do PEN Clube português sobre a abertura do concurso literário que todos os anos premeia um (ou mais, se ex-aequo) poeta (P), um ensaísta (E) e um narrador (N). E, nada é por acaso, o e-mail seguinte é sobre a nova edição de Para sempre, de Vergílio Ferreira, pela Quetzal, um romance que ganhou o PEN de Narrativa em 1984 (além do Prémio Literário do Município de Lisboa no ano anterior) e que é seguramente um dos livros preferidos dos leitores de Vergílio. Como o protagonista tem demasiadas afinidades e semelhanças com o autor, e no livro regressa já velho à casa onde  cresceu para fazer uma espécie de balanço da sua vida, a editora escolheu (e bem) reproduzir na capa deste reedição uma fotografia da Vila Joséphine, onde Vergílio passou parte da infância. Para sempre é um dos romances mais emblemáticos da literatura portuguesa (a par de outros como Sinais de Fogo, de Jorge de Sena, Finisterra, de Carlos de Oliveira ou Mau Tempo no Canal, de Vitorino Nemésio) e em boa hora volta aos escaparates, relembrando um autor que também deu muito ao ensino (foi professor no Liceu Camões) e deve ser lido pelas novas gerações.

26
Mar25

As redes

Maria do Rosário Pedreira

Este ano, no âmbito da organização de um evento, pedi vídeos a autores lendo textos seus. Fiquei surpreendida quando muitos disseram que apenas concordariam se a exibição dos vídeos se restringisse àquele evento específico e esses não fossem partilhados, nem sequer em páginas de promoção da actividade. Já muita gente prefere não estar nas redes ou na Internet e recusa deixar por aí o seu rasto. Uma das autoras explicou muito claramente que, por causa de um vídeo que foi deixado a circular livremente e apareceu numa rede social, já recebeu mensagens desagradáveis e teve dissabores. Estar presente nas redes também pode ser estar enredado, não poder sair. Se eu chamar um nome a alguém numa sala em que não há mais ninguém, é menos problemático e envolve menos humilhação do que se insultar alguém diante de mais pessoas ou mesmo de uma multidão. Numa série britânica de que toda a gente fala neste momento, Adolescência, este problema é muito visível. E, embora o meu blogue seja sobre livros, não posso deixar de aconselhar a série que, além de ser um primor de realização, vem confirmar muita coisa que ando aqui a dizer há séculos sobre jovens e redes sociais.

25
Mar25

O mês da poesia

Maria do Rosário Pedreira

No fim-de-semana passado estivemos a celebrar o Dia Mundial da Poesia no CCB com várias actividades. Março é mês de Poesia e da Primavera e lá fora, especialmente nos países francófonos, há muitos lugares onde se festejam ambas com um festival chamado Printemps des Poètes, como é o caso do Luxemburgo, aonde irei no fim do mês. Enquanto não chega a data, estou a deliciar-me com uma antologia que tem organização do poeta Rui Lage chamada Filhos da Época e dedicada ao 25 de Abril, na qual 50 poetas portugueses escrevem poemas políticos. De Manuel Alegre às ainda jovens Beatriz Almeida Rodrigues ou Inês Francisco Jacob, passando pela minha geração, com Fernando Pinto do Amaral, Jorge Sousa Braga ou Rosa Oliveira,  esta é uma antologia que representa bastante bem a poesia contemporânea e conta com um prefácio de Augusto Santos Silva, presidente da Assembleia da República aquando da ideia e da encomenda aos poetas. Aliás, a edição é da própria Assembleia. Espreite e deguste.  

24
Mar25

Paulo Teixeira e a baiana

Maria do Rosário Pedreira

Conheci o poeta Paulo Teixeira em 1996, já lá vão quase trinta anos, num encontro de poetas que surgiu por iniciativa de João Soares, então presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Nesse mesmo dia, travei também conhecimento com a querida Ana Luísa Amaral, de quem fiquei amiga, e de Fernando Guimarães e da mulher, tradutora de poesia (Maria de Lourdes); jantámos no Hotel Mundial (que parece que vai mudar de nome e de mãos) e ficámos na mesma mesa. O Paulo esteve que tempos sem publicar e há um ou dois anos publicou a Poesia Reunida que inclui um livro novo; o que eu desconhecia era que também escrevia prosa e acabo de saber que o seu primeiro romance será lançado amanhã no Âmbito Cultural do El Corte Inglés de Lisboa, às 18h30, com apresentação de António Carlos Cortez. Segundo a contracapa é um livro cheio de humor, coisa bem rara na literatura portuguesa contemporânea (o que me provoca ainda maior curiosidade). Chama-se Não Digas O Que a Baiana Tem e trata dos vários encontros que Isabel, uma jovem portuguesa, estabelece em Salvador da Baía. Como ainda nem espreitei, reproduzo o que leio na apresentação: «A narrativa regista os rituais do encontro, os diálogos ferinos, as letras de pagode, as coreografias ousadas. A festa surge como um espaço de realização pessoal, onde as personagens se vingam da rotina e da violência sempre presente. O que o leitor tem em mãos é um romance lúdico e hilariante, que retrata as vivências da juventude e reproduz a rica e inventiva linguagem popular.» Eu cá vou ler. E os Extraordinários?

21
Mar25

Excerto da Quinzena

Maria do Rosário Pedreira

Ao anoitecer a cidade mergulhava numa névoa espessa que, mais do que descer do céu, parecia surgir do rio, supurada pelas suas águas pestilentas. Uma névoa que se arrastava pelas ruelas e adquiria uma tonalidade amarelenta como se se impregnasse, ao passar, da sujidade das docas e dos subúrbios portuários, por mais que os últimos raios de sol conseguissem arrancar-lhe às vezes enganadoras centelhas de cobre. De madrugada, a sua densidade tornava-se sufocante e apenas com a chegada da manhã começava a transformar-se, sem pressas, numa ténue neblina que só desaparecia já bem entrado o dia.  Londres tornava-se então corpórea, real, tão real que podia chegar a ser insuportável. Talvez por isso os habitantes dos bairros mais pobres apreciassem, no fundo, a neblina que envolvia as noites. Ela era a mãe severa que os aconchegava e que ocultava a miséria das suas vidas, uma ardósia onde podiam desenhar sonhos até o sol voltar a levantar o véu a cada dia e a urbe, populosa, febril, fervente como um caldeirão que as águas do Tamisa não conseguiam arrefecer, mostrar o corpo feroz. Uma cidade de onde emanava um halo de corrupção que flutuava com particular densidade sobre os edifícios enegrecidos pela fuligem do bairro de Soho, como uma segunda neblina invisível ao olhar mas perceptível na alarme da pele, que se eriçava perante o espectáculo das ruas.

Ódio, de José Manuel Fajardo, Tradução de Miranda das Neves, Teodolito

20
Mar25

Possessivos e altruístas

Maria do Rosário Pedreira

Um das vantagens de aprendermos várias línguas é a graça das associações que vamos fazendo ao longo da vida. Um dia destes, já nem sei bem onde, ouvi uma pessoa num balcão de uma loja tratar a funcionária por «minha senhora» e, passaram apenas uns minutos, li a legenda de uma pintura italiana de Caravaggio chamada «Madonna di Loreto». Na verdade, a expressão «Madonna» é formada por «ma» (forma arcaica de «mia», minha) e «donna», que quer dizer senhora em italiano (nós usamos também a palavra «dona» como forma de tratamento ou para aristocratas e rainhas, por vezes abreviada D.). Assim sendo, «madonna» é equivalente a «minha senhora», o que tem alguma graça, porque o «minha» é um tanto ou quanto possessivo, ou não? Já aqui na nossa terra traduziríamos «Madonna di Loreto» por «Nossa Senhora do Loreto», ou seja, usando nossa somos mais altruístas, dividimos a senhora com todos, não a queremos só para nós. Donde virá esta diferença é que não sei... No entanto, ao lembrar algumas performances da cantora Madonna quando estava no auge, dou razão aos italianos e não deixa de me ocorrer a expressão: Minha Senhora!

19
Mar25

Relato de uma tragédia

Maria do Rosário Pedreira

Naquele dia, Griselda acordou com uma dor de cabeça insuportável e não se conseguiu levantar da cama. Teve de ser Flavia, a filha de seis anos, a lembrá-la de que tinha de ir para a escola. A mãe levou-a a custo e, já em casa, sentou-se ao espelho e maquilhou-se exageradamente, enquanto os filhos pequenos brincavam por ali. Mas a dor persistiu e, quando abriu a porta para dizer ao marido que não se sentia nada bem, Claudio ignorou-a (detestava vê-la maquilhada), desconhecendo a surpresa horrorosa que o esperava no regresso a casa. Griselda e Claudio, argentinos fugidos da ditadura e exilados em França, eram porteiros de uma escola onde a autora deste livro, sua conterrânea, os visitou em criança; e foi com a recordação da sua incredulidade perante os factos acontecidos naquele dia que, mais de trinta anos depois, resolveu contar esta história improvável de um homicídio e entrevistar todos os implicados: Griselda, Claudio, a pequena Flavia, a professora, até a advogada... E é pelas vozes de todas essas pessoas que saberemos como uma mulher que passou por tantos contratempos e desgostos desde a infância se tornou um monstro naquele dia e, ainda assim, depois do crime hediondo que cometeu, foi para a filha uma mãe amorosa. Baseado numa história verdadeira, Naquele Dia, de Laura Alcoba (que virá no final do mês a Portugal), é o relato incrível das causas e consequências de um acto inominável e da forma como por vezes basta uma palavra para desviar alguém do seu destino. Um livro que não se consegue parar de ler.

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18
Mar25

A Booker is a Booker is a Booker

Maria do Rosário Pedreira

Há prémios que não me dizem nada, mas tendo a confiar no Booker Prize, pois provavelmente a maioria dos romances que chegaram à final ou venceram esse prémio foram livros de que gostei bastante ou de que gostei muito. Nos últimos anos, claro, houve algumas excepções (Bernardine Evaristo não é a minha praia, devo dizer...) e o Booker, como todos, teve alturas em que fugiu mais para as questões fracturantes do que para a literatura, o que me desiludiu; ainda assim, a média manteve-se muito alta em termos de qualidade. E não é que este não tenha qualidade, mas o penúltimo vencedor do Booker Prize Internacional publicado em Portugal pareceu-me na verdade aborrecidíssimo: repetitivo, pretensioso, cheio de filosofices e com referências muito óbvias a peças de música clássica, não sei explicar, mas li-o arrastando-me ao longo de muitas páginas e suspirei de cansaço em alguns capítulos, quase iguais a outros que tinham aparecido umas quantas páginas antes. Calculo que o problema não seja do livro, mas meu; afinal, os encómios lá fora e cá dentro a este livro (Kairos, de Jenny Erpenbeck) repetem-se, e a badana até sugere a ainda jovem autora como obviamente nobelizável (expressão retirada de um artigo de um jornal bastante respeitável); por isso devo ser eu que ando sem grande ânimo para leituras do tipo. Aos que já o leram pergunto se gostaram, talvez isso me possa dar uma ideia clara sobre o meu estado actual, mesmo que não sobre o romance. Um autor que publico, ao entregar-me o seu último original, perguntou-me se ainda estaria bem de cabeça e podia continuar a escrever. Eu pergunto a quem já leu se a minha cabeça ainda estará boa para apreciar originais...

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