Com ou sem badanas?
Quase sempre se escreve na contracapa de um livro um texto que resuma o seu enredo ou avance o assunto de que trata. Nem todos os livros têm badanas (eu gosto dos que têm porque as uso como marcadores), mas, geralmente, quando estas existem, são, entre outras coisas, usadas para proporcionar aos leitores um cheirinho da vida do autor (e por vezes até um relance da sua cara, mais ou menos bonita, tanto faz). As pessoas são curiosas e gostam de saber pormenores sobre quem escreve. O problema é que, de vez em quando, esbarramos numa badana biográfica totalmente disparatada... E já nem falo do número de filhos ou da raça dos cães (detalhes que os norte-americanos adoram acrescentar), mas de dados distribuídos pelas linhas à má fila, sem o mínimo bom senso. Um dia destes, por exemplo, caíram-me os olhos numa badana que começava logo por dizer que a autora era escritora. Ora, se tínhamos um livro dela na mão (e sei lá quantos mais escreveu ao longo da vida), seria mesmo preciso dizê-lo? (Quase me apetece sugerir que faria mais sentido explicar em certas badanas que quem assina o livro NÃO é um escritor.) E a verdade é que não dizia que “era” escritora, mas que o “fora” – mais estranho ainda, porque depois das datas de nascimento e morte entre parênteses a seguir ao seu nome, já tínhamos certamente concluído, se também não o soubéssemos já, que a senhora partira deste mundo. Não bastando isso, a frase seguinte informava-nos de que tinha sido casada com determinado escritor, como se isso lhe conferisse um estatuto que, solteira, nunca atingiria (e há muita gente entendida que sempre a achou muito melhor do que o marido, ainda por cima). Pois bem, parei de ler ali mesmo. Como o Joaquim Namorado disse ao Manel quando ele era estudante em Coimbra, os escritores são para se ler, não para se conhecer. Badanas para quê?