Meias-tintas
Há muitos anos, numa aula de Literatura Inglesa na Faculdade de Letras, um certo professor declarou, assim sem mais nem menos, que O Último Tango em Paris era um filme sobre a pintura americana. Estranhei, claro, pois o que ouvira dizer do filme nada tinha que ver com a pintura; mas, como na altura não o tinha visto, achei melhor reduzir-me à minha insignificância. Vi-o mais tarde e, mesmo tendo aquela declaração presente e já sabendo mais sobre a pintura americana e sobre outras coisas nessa altura, a verdade é que (mea culpa) não consegui atingir o statement do meu professor. Contudo, ao terminar há dias a leitura de A Beleza e a Tristeza, do japonês Yasunara Kawabata (ouvi alguns conselhos que me deram aqui no blogue e insisti um pouco mais na cultura nipónica), ficou-me a sensação de que, além do enredo, o romance é de certo modo uma obra sobre a pintura japonesa. Claro que trata de outras coisas, do amor quase sempre – magoado, preterido, ciumento, lésbico e vingativo, estados de alma que, descritos por um japonês que ganhou o Nobel em 1968 e se matou em 1972, têm um sentido quase pictórico, sobretudo na cena em que Keiko, a apaixonada e estranha discípula da pintora Otoko, confessa que tem um mamilo insensível e não permite que ninguém o toque. Não foram das horas mais extraordinárias que passei, mas não se pode querer tudo e aprendi muitas coisas sobre o país do Sol nascente e... a sua pintura.