Passar a palavra
Quando era estudante na Faculdade de Letras, estava convencida de que os meus professores tinham lido tudo o que eu tinha lido e, obviamente, muito mais. O «muito mais» era, de resto, verdade, mas nem sempre as suas leituras e as minhas, afinal, coincidiam. Aquilo que se vive e publica em determinada época marca quase sempre as leituras de uma geração – e a verdade é que eu já não li muitos dos livros que leram os que têm mais quinze anos do que eu, mas também não lerei muitas das obras que fazem hoje as delícias dos meus jovens autores. E, porém, há que confessar que foi por publicar jovens autores que me encontrei com dois livros excepcionais que, por razões que agora não importa aprofundar, me tinham até então escapado. Um deles é o delicioso Bartleby, o Escrivão, de Herman Melville, de que João Tordo me falou sempre entusiasticamente e comprei na fantástica colecção reunida por Borges e agora publicada pela Presença. O outro (que, de tanto se falar nele, teria acabado por vir parar-me à mão) é As Velas Ardem até ao Fim, de Sandór Márai, uma pequena maravilha de que tomei conhecimento há uns anos, acompanhando o José Luís Peixoto a uma comunidade de leitores na Biblioteca de Almada, onde ele falaria sobre o seu Morreste-me; Maria João Seixas, que então animava essa comunidade, indicou no fim da sessão aos participantes que a próxima leitura seria a novela do escritor húngaro, e o José Mário Silva, que também estava presente, fez o favor de partilhar comigo as suas impressões muito positivas sobre a obra. Ambos são literatura a não perder e agradeço aos mais novos que mas tenham aconselhado tão vivamente. Agora, passo a palavra.