Premonições
Há uns tempos, escrevi um post sobre a falta que me iam fazer num futuro não muito longínquo as presenças activas dos editores com quem fui aprendendo ao longo dos anos; e, na semana seguinte, um deles teve de ir desentupir uma carótida de urgência e outro abandonou na LeYa a chancela que dirigia há mais de vinte anos. Alguém me disse que esse meu post tinha qualquer coisa de premonitório e, se eu acreditasse em premonições, passaria a ter mais cuidado com aquilo que escrevo. Mas não acredito – e encontrei durante a vida um livro excepcional de um cientista – Carl Sagan – que desmistificava, entre outras superstições e crenças, os sonhos premonitórios, dizendo que basta fazer uma estatística sobre a quantidade de vezes que sonhamos coisas que não acontecem para ficarmos convencidos de que, quando acontecem, não estamos senão perante uma coincidência. A obra, recentemente reeditada, intitula-se O Cérebro de Broca, vindo este Broca do nome do homem que terá identificado a área do cérebro que aloja a capacidade de articular o pensamento com o discurso (deve ser mais complicado do que isto, mas corrijam-me os especialistas nestas coisas) e explica de forma acessível (como era usual em Sagan) as muitas fraudes ou falsidades bem construídas que, ao longo do tempo, convenceram milhões de ingénuos em todo o mundo. Feito de pequenos capítulos, aquele que mais me deslumbrou foi o que se debruçava sobre as experiências próximas da morte e os relatos dos que passam por isso e contam que viram uma luz branca e a imagem de Deus – e que o cientista interpreta como uma memória do nascimento (a expulsão do bebé que vem do corpo escuro para a luz e as imagens difusas do médico ou da parteira que o esperam cá fora). Lê-se como um romance e é muito bom para afastar crendices e pôr as coisas no devido lugar.