Um dos leitores deste blogue acusou-me um dia destes de falta de fé no estado actual da educação portuguesa. Fez-me ver que, sendo mais velho do que eu, acreditava, pelo contrário, que as novas gerações estavam francamente mais preparadas cultural e intelectualmente. Não posso negar que, ao longo destes vinte e tal anos que trabalhei, fui tendo colaboradores jovens que, a cada ano, chegavam menos cultos e interessados – e daí, quiçá, a minha falta de fé. Mas, como em tudo, há excepções e já aqui elogiei algumas pessoas que trabalham ou trabalharam comigo e que contrariam a minha desconfiança – e não as considero sequer aberrações. Pelo facto de me dedicar acima de tudo à publicação de jovens autores, sinto, aliás, que bem podiam dispensar-me da acusação de falta de crédito nas novas gerações. Entre os editores activos, sou dos poucos que se dão ao trabalho de ler cem originais para, como agulha em palheiro, encontrar aquele que faz a diferença (e podem, mais uma vez, atirar-me com a questão do gosto, que nem me importo muito, pois quem premeia em Portugal e quer traduzir noutros países tem um gosto, pelos vistos, semelhante ao meu). Sei, obviamente, que há muito mais jovens brilhantes hoje do que noutros tempos, mas também sei que muitos deles estudaram lá fora ou foram trabalhar para o estrangeiro assim que terminaram os cursos. Respeito muito os bons professores, entre os quais talvez se encontre esse meu leitor, mas ainda vão ser precisos muitos anos para me convencer de que foi apenas a escola – e sobretudo a portuguesa – que preparou os melhores.
4 comentários
Margarida Almeida 13.04.2011
Boa noite Ana! Recebi um email em o seu texto foi colocado na íntegra. Como sou professora, de Ciências Físico-Químicas, li-o avidamente. Que triste Ana! Sinto-me triste por sentir que a Ana, não tem um único bom referencial, pelo menos no ensino secundário, e que tenha ficado com má impressão dos professores. Mas, tenho de dar a "mão à palmatória" em relação a algumas coisas que disse. Quando refere a falta de ética que cada vez mais, infelizmente, se sente nos professores, quando refere a falta de profissionalismo. No entanto quero dizer-lhe que os rankings valem o que valem e valem os interesses de uns quantos (poucos). No entanto, parece-me que alimenta ainda mais a falta de ética! Poderia tentar arranjar desculpas para uma série de coisas e poderia até fazer-lhe ver também o outro lado da questão. Muitos professores por essas escolas fora, pelos vistos menos bem cotadas nos rankings nacionais, são muito bons profissionais e que não são valorizados, porque a avaliação de professores é como os rankings... vale o que vale... poderia falar do facto de haver muito desencanto com a profissão e não me vou alargar a referir os motivos sociais (entre outros) para tal. Mas não farei nada disso, até porque não me parece o local apropriado. No entanto reconheço que muito do que referiu também é verdade e já vi tanto por essas escolas... Sabe Ana, parece-me uma jovem com a "cabeça em cima dos ombros", passo a expressão. Fico triste por si e por todos os jovens que se sentem como a Ana! Fico triste por mim também. Porque ainda acredito no que faço e faço o melhor que sei e com muito brio (ao ponto de, por vezes, ser criticada, "nas costas", por esse facto). Posso apenas referir que mesmo tendo tido as "piores" turmas em muitas escolas, nunca tive problemas disciplinares com os meus alunos, porque nunca me senti superior a eles, em nada. É óbvio que sou a professora e eles os alunos, mas nunca os tratei a não ser com respeito e, se calhar por isso, sempre fui muito respeitada e ainda hoje me comunico com muitos deles. Apenas quero dizer com isto, que me entristeceu ver ao que chegou o nosso ensino. Ainda bem que a Ana tem paixão pelo que faz e tem objectivos. Tenho a certeza será uma excelente profissional! Já agora lhe digo que as outras escolas do país provavelmente não são tão más assim, bem como a sua não será tão boa quanto o que figura no ranking. É que toda a escala é apenas uma representação da realidade e, com toda a certeza saberá que uma medição tem sempre erros associados. Este caso não é excepção.
Que resposta tão agradável, à boa maneira Físico-Química, que eu adoro! Conheço, por ter ouvido falar a pessoas amigas e próximas, casos de professores como a dr.Margarida, com genuíno gosto pela importante função de formar as gerações mais novas. Quero acreditar que, como algumas vozes afirmaram, esses ainda são a maioria e eu fui deveras azarada. Afinal, quando uma observação é muito excêntrica em relação a todas as outras, costuma-se desprezar, não é?
Quanto a mim, não se entristeça, porque, como penso que subentendeu, tenho paixão e energia suficientes para mais anos do que aqueles que vou viver. A si peço-lhe encarecidamente que procure continuar a fazer a diferença para cada um dos seus alunos. Eu, que estou do outro lado da secretária, lhe asseguro que é um só gesto, uma palavra, que pode mudar a vida a um jovem confuso! Bem-hajam todos os bons professores deste país!
Senti sim que a Ana tem muita energia! E por favor também lhe peço encarecidamente que não caia desmesuradamente na chamada deformação profissional. Acontece que também na medicina há bons e maus profissionais. Mas por vezes o que dói verdadeiramente a quem está fragilizado, por estar doente, é a indiferença dos médicos! É óbvio que tem que haver um certo "afastamento" para que se possa fazer um diagnóstico ou tomar um decisão o mais correcta possível. No entanto, indiferença é outra coisa... Quanto a mim, acredite, vivo com paixão e não sei viver de outra forma. Quando a centelha da paixão se for na minha vida profissional, acredite, deixarei o ensino e me dedicarei à minha horta, ou a outra coisa qualquer. Mas conhecendo-me como me conheço... sinto que continuarei apenas a ser quem sou, de forma genuína. Acho que é a melhor postura nesta sociedade em declínio.