Os Portugueses têm uma certa tendência para o derrotismo e para a preguiça – e muitas vezes preferem dizer simplesmente mal das coisas a lutarem para que estas, decididamente, melhorem. Quando há uns meses estive em Cabo Verde para fazer o lançamento de O Novíssimo Testamento, o seu autor, Mário Lúcio Sousa (que é, actualmente, o ministro da Cultura daquele país) contou-me que, na sua pátria, se passa exactamente o contrário. E partilhou comigo uma história de dois amigos que tinham de apanhar diariamente um transporte numa paragem à torreira do sol e que não descansaram enquanto o governo não lhes arranjou um telheiro para se abrigarem. Chegados nesse dia à paragem ficaram contentíssimos com aquela conquista. Porém, no dia seguinte, um deles logo se queixou: «Eh, nem puseram bancos...» Tenho a certeza de que, por esta altura, já lá estão os bancos – e é bem possível que uma máquina de refrigerantes também.
2 comentários
António Luiz Pacheco 15.06.2011
Diz um anónimo: "Esta mania de ir buscar os clichés do que fomos e não ser capaz de olhar para o que somos." (sic)
Não é uma mania, é sim procurar entender as coisas, porque a história se repete... é na história e no passado que está a compreensão quer do presente quer a previsão do futuro. Quem não sabe quem foi nem de onde vem, como pode saber onde está e para onde vai?
Meu caro anónimo, nem precisa de ir muito longe, recue 130 anos... ao tempo do seu bisavô cujas memórias ainda eram vivas no tempo de seu avô e pai, e terá (com as naturais nuances próprias das épocas) uma noção de que o que se passou é semelhante à actualidade... olhe, a emigração é bem o caso, pois houve em meados e finais do século XIX uma forte corrente migratória... pelas mesmíssimas razões... Atente no que se dizia n' O San Francisco Bulletin, em 1871, sobre os portugueses: - "Trabalhadores, pacíficos e pouco dados à especulação, ficam para trás no percurso de outros grupos mais apressados e empreendedores, mas mesmo assim contam-se entre os mais poupados e prósperos dos muitos que procuram numa terra mais vasta a riqueza e a liberdade de acção que as nações mais antigas e povoadas não podem oferecer… Em regra, os portugueses poupam cuidadosamente todos os dólares que ganham, vivem em sóbria economia e abdicam dos mais elementares prazeres da existência". Lia-se no Yreka Journal , em 1868, uma prova da boa vontade para com os imigrantes: “Vêm aí os portugueses! Tivemos conhecimento de que em breve chegarão a este condado cento e quarenta portugueses, vindos das ilhas portuguesas e de outros condados deste Estado, entre eles um certo número de mulheres e de crianças. Os portugueses de Hawkinsville tratam já dos preparativos para os receber, e amanhã haverá uma reunião de mineiros para definir a área das concessões. Alguns deles tencionam também adquirir ranchos e prevê-se que grande parte da população do nosso condado seja constituída por portugueses, que são pessoas diligentes e muito trabalhadoras”. (in II volume de “Largueza”, páginas 369 a 372)
Talvez isto lhe ajude a perceber porque é que sou dos que acham que vale a pena "olhar para ontem".
Ao que parece ainda devo ser dos poucos que escreveu uma coisa a pensar nos portugueses e para eles, onde nem os retrato como atrasados nem alardeio os seus defeitos, como se eu não fosse um deles e por me pôr de fora a apontar-lhes os defeitos, me distinguisse. Pelo contrário gabo-lhes as qualidades, que as conheço e muito bem. Felizmente... pois são a minha gente, não os modernos nem os bem-falantes, que vestem à moda e possuem uma cultura superior, não... os meus são os outros, os que suam ao Sol, que andam de transportes e cheiram a sovaco, a vinho e a refogado, mas com quem existe um pacto antigo, pois são eles quem nos suporta, aos outros que estudámos, vestimos fato, compramos livros e discutimos estas coisas, pois nos sobra tempo!