A morte das bibliotecas privadas
Pacheco Pereira é um grande leitor e escreveu um artigo notável sobre a forma como hoje se lê (como se lê menos, mesmo que haja mais gente a ler) e a anunciada morte das bibliotecas privadas. Há quarenta anos, quem gostava de ler acumulava livros nas estantes, muitos livros a que voltava vezes sem conta – e as gerações actuais não sabem o que fazer com as bibliotecas de seus pais e avós quando estes morrem. Não há espaço para elas nos novos apartamentos, quase sempre mais pequenos; mas, segundo o articulista, mesmo que houvesse, elas não deixariam de ser, em muitos casos, bibliotecas mortas, porque, para estar viva, uma biblioteca tem de ser alimentada regularmente com livros novos, e esta regularidade nem sempre acontece com os leitores mais jovens. O facto de as suas casas não terem muitos livros nas estantes (ou não terem estantes sequer) não pode, porém, como diz Pacheco Pereira, ser explicado apenas por uma troca de suportes – do papel para o digital – mesmo que hoje se leia quase tudo de borla na Internet e haja muita gente a ler livros em tablets. A verdade é que, ainda que, em virtude da democratização do ensino, haja mais gente a ler, isso não significa que leia com o mesmo «grau qualitativo», nem com a mesma necessidade quotidiana que tinham os leitores antigos, que podiam gastar duas horas por dia a ler, sentados na sala, autores como Faulkner ou Balzac, enquanto os actuais, nessas duas horas de leitura, estarão simultaneamente a ver os e-mails que recebem, a ouvir música, a consultar o YouTube, a mandar mensagens (e por isso não estarão a ler com a mesma atenção dos pais e avós, ou seja, não estarão a reter do livro o que aqueles retiveram). Uma excelente análise de um homem que gosta das novas tecnologias, mas não se deixa deslumbrar por elas.