Anti-biblioteca
Pouco tempo depois da morte de Eduardo Prado Coelho, a Casa Fernando Pessoa organizou uma homenagem ao crítico e professor, em que amigos, conhecidos e admiradores liam excertos ou pequenos textos da sua autoria. Na ocasião, escolhi uma crónica que tinha que ver com o facto de uma biblioteca só ser realmente uma coisa interessante quando existem nela tantos livros não lidos como livros lidos. (Se pensarmos bem, os livros lidos que não sejam obras de consulta são, afinal, os mais inúteis que lá estão…) Foi também esta ideia que encontrei recentemente num artigo de Jessica Stillman sobre o facto de nunca nos devermos sentir culpados por nas nossas estantes haver tantos volumes não lidos. A autora do artigo cita, de resto, o autor e estatístico Nassim Nicholas Taleb, que chama ao conjunto destes livros não lidos uma «anti-biblioteca» e diz que todos precisamos de uma para nos lembrar constantemente de tudo o que ainda não sabemos (Umberto Eco também dizia isto). A anti-biblioteca, ao que parece, vai crescendo com a idade do dono e, quanto mais conhecimentos este adquire, mais livros não lidos acumulará. Às tantas, esses livros não lidos (tantos, tantos) vão parecer até ameaçadores, mas o melhor é não nos sentirmos culpados, porque a nossa biblioteca, segundo o artigo, nunca deve ser um mostruário do que lemos que acene aos outros a nossa cultura, mas um repositório daquilo que em algum momento nos despertou curiosidade e interesse e quisemos – ou ainda queremos – saber. Gosto da ideia.