Aqui há gato
Dizem que, em tratando-se de comer frango, uns gostam de perna e outros de peito (cá em casa é exactamente assim – e dá jeito, porque nada se desperdiça). Dizem também que os que gostam de cães não são especialmente apaixonados por gatos, e vice-versa. Eu sou mais cães, confesso, e também confesso que não consigo confiar inteiramente em gatos nem pegar-lhes ao colo, embora não faça fitas quando vou a casa de alguém que os tenha (geralmente, mais de um). Mas gosto de os ver nas traseiras da casa a brincar, a uma certa distância, claro, e gosto de pôr gatos em poemas, talvez porque os ache mais inteligentes e sagazes do que os cães (alguns, pelo menos) e admire até certo ponto a sua natureza independente e selvagem (e, por isso, mais apropriada ao poema). No entanto, fiquei um dia destes rendida à singularidade dos felinos, ao ler uma notícia inesperada sobre a sua apetência para ouvir ler. A sério, parece que os bichanos, sobretudo se já passaram por traumas nas suas sete vidas, apreciam o ritmo da leitura de histórias, o som ritmado de vozes humanas. Na Pensilvânia, na Berks Rescue Animal League, existe mesmo um programa com o nome engraçado de «Book Buddies», em que crianças a partir dos seis anos se oferecem para ler aos gatos residentes, tendo a actividade apresentado resultados extraordinários: além de os bichos ficarem mais mansos e simpáticos (o que os tornará mais facilmente adoptáveis por famílias interessadas num animal de estimação), as crianças aperfeiçoam o seu desempenho na leitura e, melhor ainda, criam raízes na prática de voluntariado. Há coisas que não se explicam, mas, quando eu pus gatos nos meus poemas, talvez já tivesse o pressentimento de que eram animais literários...