Cemitérios
Na passagem da lista maior para a lista mais pequena (a dos seis finalistas) do Man Booker Prize, caiu curiosamente o livro de Arundhati Roy, O Ministério da Felicidade Suprema (ASA), candidato vinte anos depois de o seu antecessor, o romance-maravilha O Deus das Pequenas Coisas, ter ganho o galardão. O segundo romance da escritora indiana (pelo meio, ela escreveu muitos artigos e ensaios, mas não ficção) é um livro menos susceptível de reunir o consenso dos leitores, embora nele se mantenha esse estilo único da senhora Roy e o desenho de algumas personagens que dificilmente esqueceremos, como a hermafrodita Anjum ou a bela Tilo (que li algures ser uma espécie de alter ego da autora). Existindo muitas mais personagens neste livro do que no anterior, a verdade é que a profusão de nomes indianos (que não descortinamos imediatamente pertencerem a homens ou mulheres) emperra um pouco a leitura; e, se por um lado parece necessário ter já algumas noções sobre a questão de Caxemira para compreender o verdadeiro alcance desta história, por outro lado, aqui e ali também sentimos que existe uma certa pedagogia que torna o enredo um pouco menos fluido. Mesmo assim, ele deve ser lido, até porque tem algumas ideias belíssimas, como a da Casa de Hóspedes construída à roda das lápides de um cemitério num país onde, por acaso, os hindus não enterram os mortos. Também é num cemitério que decorre o polifónico romance de George Saunders, Lincoln no Bardo (Relógio d’Água), onde Abraham Lincoln passa uma noite junto ao túmulo do filho, morto uns dias antes. O autor – até aqui só de contos – foi sobejamente elogiado por esta obra, entre outros, por Zadie Smith, Jonathan Franzen e Thomas Pynchon. E o livro – esse – continua na short list do Man Booker. Os cemitérios estão na moda em literatura.