Coitado
Já não sei quem era que, quando alguém na minha família se referia a um tipo com pouca sorte como "coitado", imediatavamente ripostava: "Coitado é corno." Não sei se foi por isto, mas, ao crescer e interessar-me pelas origens da língua portuguesa, fiquei com a sensação de que este adjectivo, "coitado", estivesse de alguma forma ligado etimologicamente à palavra "coito" e, nesse sentido, traduzisse o estado de alguém cujo cônjuge tivesse ido buscar parceiro sexual (para o coito, portanto) fora de casa... Não é totalmente mentira: a palavra "coitado" é definida pelo dicionário como "desventurado", "desgraçado", mas também como "homem traído pela mulher"; no entanto, o vocábulo "coitado" não deriva de "coito", como eu pensava, mas do provençal "coitar" (desgraçar, magoar, causar "coita", desgosto, a alguém), que, por sua vez, provém do latim vulgar "coctare", que significa empurrar, impelir, obrigar, violentar (mas não tem a ver com o "coito", insisto, embora assim de repente pudesse parecer que sim, tantas são as confessadas relações sexuais forçadas em todas as épocas e geografias). O "coito", ao que parece, vem, porém, de "coitus", que é qualquer coisa como unir-se, juntar-se (é isto a cópula, enfim) e, na origem, "ir na companhia de". Já o "coito" de quando se joga às escondidas (que estranho pensar hoje a quantidade de vezes que gritei "Coito!" na infância....) tem a ver com segurança (com "acoitar", estar protegido), embora se possa sentir "acoitado" um homem cujo coito corra bem, digo eu, e sobretudo com a legítima, para não se tornar "coitado". A língua portuguesa, já dizia o outro, é muito traiçoeira.