Conhecer
Quando Afonso Reis Cabral ganhou o Prémio LeYa com vinte e poucos anos, ouvi-o dizer numa entrevista que escrevia sobre o que conhecia. O seu romance O Meu Irmão, sendo obviamente ficção, tinha como protagonista um homem que tinha um irmão com síndrome de Down, e não por acaso Afonso Reis Cabral também o tinha, o que lhe permitiu seguramente descrições mais credíveis do comportamento da personagem. Devemos escrever sobre o que conhecemos bem? Será melhor a nossa ficção se ela espelhar uma realidade de que estejamos mais próximos? Perguntei-me isto por causa da entrevista de Arturo Pérez-Reverte ao Ípsilon na sexta-feira passada a propósito do seu Linha da Frente, que decorre durante a Guerra Civil espanhola. Ali pode ler-se que teve «três fontes fundamentais de informação: “Uma, os muitos livros de uma biblioteca sobre a guerra civil, li tudo o que fosse História, ensaio, romance, e também vários autores estrangeiros. Outra fonte foi a minha família: o meu pai, o meu tio e o meu avô, que fizeram a guerra civil. Foram fontes directas, contavam-me histórias, não eram discursos manipulados por terceiros, contaram-me algumas das suas experiências. A terceira fonte foi o facto de eu ter estado em guerras civis [como repórter para o canal de televisão TVE]. Das dezoito guerras em que estive, oito foram guerras civis: Angola, Moçambique, El Salvador, Nicarágua, Jugoslávia, Líbano... Eu sei o que é uma guerra civil. Não foi o cinema que me contou. Vi-as, ouvi-as, cheirei-as e falei com as pessoas. Tenho três boas bases de autoridade para falar sobre isso.”» Tiremos daqui as nossas conclusões.