Corrigir e aperfeiçoar
Muitas vezes, quando estou a ler, descubro frases e expressões que poderiam ter sido corrigidas se o autor tivesse tido a possibilidade de meter o seu manuscrito na gaveta durante uns meses e, ao fim desse tempo, o relesse e revisse. Há frases tão desastradas que tenho a certeza de que os próprios autores dariam pelo descalabro se não estivessem tão apressados para entregar o texto para publicação. Um dia destes, por exemplo, no romance de alguém conhecido (não falo de nenhum jovem autor), encontrei uma passagem em que a personagem caminhava «na direcção» de alguém e se «dirigia directamente» a essa pessoa para lhe perguntar já não sei o quê. Mas ninguém deu por isto? Recuso-me a acreditar que foi de propósito, tão coxo ficou... Mas, bem sei, os escritores querem desembaraçar-se dos seus livros e dividi-los com o público assim que os dão por terminados. Li algures que o pintor francês Pierre Bonnard, que estava sempre a precisar de dinheiro, também vendia os quadros sem os «rever»; mas depois, ao que se conta, chegava a arrombar as casas dos compradores das telas e ia acabá-las ou aperfeiçoá-las às escondidas. Uma bela história que é também um exemplo de exigência. Só que aos escritores pede-se que façam isso antes de o livro impresso.