Ele há coisas
A vida não está fácil. Os sem-abrigo que, segundo me lembro, eram uma prioridade para o nosso Presidente, não diminuem, pelo contrário, estão a aumentar; e costumo ver alguns com a cabeça enfiada nos caixotes de lixo à minha porta, até porque a frutaria aqui ao lado deita fora muita coisa que está demasiado feia ou madura para ser vendida, mas que ainda se pode comer. No entanto, há quem ande no lixo por outras razões, e o jornal Público de dia 8 de Dezembro contava a história de um operário que, vejam lá, encontrou no lixo documentos anteriores à nacionalidade. É muito provável que o antigo dono fosse um coleccionador recentemente falecido e que a família, ansiosa por esvaziar a casa, tivesse posto no lixo aquela "papelada", desconhecendo tratar-se de algo precioso. O operário Mário Rui Ferreira, numa rua da Figueira da Foz, encontrou então há uns anos uns maços de jornais antigos muito arrumadinhos, coisas que lhe pareceram do tempo da Revolução, e resolveu guardá-los numa garagem. Foi só, porém, quando teve de abandonar o local porque o senhorio precisou dele que olhou melhor para aquelas pilhas de jornais e viu que entre as páginas havia, afinal, documentos com... mais de mil anos! Ainda tentou vendê-los na OLX, e foi aí que, por sorte, encontrou do outro lado uma conhecedora séria que percebeu que se tratava de um conjunto documental raro e valioso. A senhora pediu para ver os documentos, avaliou-os e hoje está tudo, para consulta, na Torre do Tombo. Presumo que o senhor Mário Rui Ferreira nunca mais deixou de olhar para o lixo com olhos de ver e que enfie muitas vezes o nariz nos caixotes de lixo. Mas, graças a Deus, por boas razões.