Escreve ou não escreve?
Estou, já aqui o disse, a preparar um curso sobre escrita e edição; e foi nesse âmbito que me surgiu a questão (julgo eu que bastante pertinente) que aqui trago hoje e que tem que ver com aquele a que chamamos «escritor». Ora, na página de um escritor bem conhecido (sua página «oficial», diria eu) o nome aparece seguido de: «Escritor, poeta, ensaísta.» E, embora seja tudo verdade (ele é tudo isso), estou intrigadíssima com a sequência porque... Então um ensaísta não é escritor? E um poeta não é escritor? Escritor é apenas o autor de livros de ficção, o romancista? Bem sei que a poesia nasceu numa tradição de oralidade, mas o tempo de Homero ou dos trovadores já lá vai há séculos e não consigo entender porque, em pleno século XXI, se mantém esta mania de, nos jornais ou na Internet, se escrever debaixo de um nome de uma pessoa que escreve poesia e ficção «escritor e poeta» , como se o poeta não escrevesse, fosse apenas um dizedor. Também se pode discutir que «escritor» aponta para um criador literário e que o ensaio nem sempre implica criatividade. Mas há ensaístas altamente criativos, e lá que o ensaísta escreve não há dúvida. Outra coisa esquisita é, nos jornais portugueses, meterem geralmente a poesia na categoria da ficção, quando a poesia é talvez (por mim falo) o menos ficcional dos géneros. «Ficção» estará então ali em vez de «literatura»? Donde virão estas malfadadas confusões?