Excerto da Quinzena
Festejávamos, com alguns meses de atraso, os dez anos da refundação do Instituto por Paul, ao mesmo tempo que prestávamos homenagem à pessoa do fundador. Ou, mais precisamente, celebrávamos o décimo aniversário da «unificação» do Instituto, na primavera de 1991, e o quadragésimo aniversário da sua criação em 1961. Mas tratava-se, acima de tudo, de uma celebração dos trabalhos de Paul. Acho que não faltava ninguém – dos históricos, os do Leste, estavam todos presentes; os novos membros, os colegas de Berlim e de outros lugares tinham quase todos aceitado o convite. Alguns, como Linden Pawley, Robert Kant e alguns investigadores franceses, até tinham vindo do estrangeiro. Este congresso flutuante intitulava-se Jornadas Paul Heudeber; estavam previstas dois sessões por dia, teoria dos números, topologia algébrica, assim como uma sessão de história da matemática na qual eu iria participar.
O único ausente era o próprio Paul.
Maja acabava de festejar o seu octogésimo terceiro aniversário.
Maja bebia litros de chá.
Maja estava alegre e triste e silenciosa e faladora.
Todos sabíamos que o lugar dela não era ali, a bordo do Beethoven num colóquio de matemática; todos sabíamos que ela era indispensável ali.
Mathias Énard, Desertar, tradução de Joana Cabral