Excerto da Quinzena
E, no Outono, entrei para a escola.
A 7 de Outubro.
Escrevo em cardinal e não por extenso, porque foi assim que este número nos foi gravado a fogo: o desenho de um punhal deitado que dobrava a lâmina para baixo para se enterrar nos nossos corpos espantados de criança. «7.» Depois desse sete-seta, nunca mais voltaríamos a acreditar na bondade dos adultos. Na primeira classe, aprendíamos que a nossa infância morreria, todos os dias, mais um pouco.
A mãe levou-me pela mão, estrada fora, com outras mulheres que iam acompanhar os filhos no primeiro dia. Riam-se muito e falavam alto, nervosas.
«Ficas com o senhor professor que logo venho-te cá buscar.»
Havia crianças que choravam, que se agarravam à saia das mães, que se despegavam a custo ou à bruta, conforme o caso. Eu, não. Sabia que não adiantaria nada.
Várias mulheres repetiam por delicadeza, bem alto, a voz sempre nervosa:
«E se ele se portar mal, bata-lhe, senhor professor. Arrime-lhe, que tem a minha autorização.»
Possidónio Cachapa, A Selva dentro de Casa