Excerto da Quinzena
Imaginem uma menina de onze anos.
Imaginem-na com uma bandolete vermelha e um par de calças axadrezadas.
É 1985, e a Anna está na escola: sentada na primeira fila, os dedos manchados de tinta, muito atenta enquanto o professor de matemática explica a teoria dos conjuntos.
O homem tem cerca de quarenta anos; está de costas, tem uma mão no bolso e com a outra escreve no quadro: A ⊂ B.
Algum de vocês sabe o que significa aquele símbolo que desenhei entre a letra A e a letra B?, pergunta, virando-se para a turma. Caminha entre as mesas lentamente, chega ao fundo da sala de aulas e volta para trás, aproxima-se do estrado, apoia um pé no degrau, vira-se de novo para olhar para os alunos.
Silêncio.
O professor ostenta um sorriso malicioso, sarcástico: Não sabem porque são burros, ou era a vossa professora da escola primária que era burra?
Imaginem que o homem permanece imóvel por alguns instantes. E que depois recita aborrecido: A é um subconjunto de B, portanto, todos os elementos do conjunto A pertencem ao conjunto B. Dúvidas?
Silêncio.
Bem! Então, qual de vocês é capaz de dar-me um exemplo?
Silêncio.
Quantos de vocês representam o subconjunto “burros” do conjunto “turma”? O professor arregala os olhos.
Imaginem que caminha de novo entre as filas, fixando um a um os alunos, só os rapazes, evita as raparigas, e que, de repente, contudo, para à frente de uma morena e diz-lhe que vá ao quadro. E que, mal ela se levanta, ele inclina a cabeça e observa-a a andar.
Michela Marzano, Continuo à espera de Que Me Peçam Desculpa, trad. Sara Peres