Excerto da Quinzena
(Excepcionalmente à segunda, porque sexta foi feriado.)
Esquecida entre os cadernos do liceu, uma fotografia antiga. Mostrava Jacinto, os pais e as irmãs junto do monumento aos Descobrimentos. Usavam todos roupas leves e frescas. A luz reverberava no leito do rio e contra o calcário das estátuas. Acompanhavam a família duas raparigas que não conhecia, talvez parentes dos Açores. No verso da fotografia li a data: julho de 1960. Datava da inauguração recente do monumento, quando o padrão original, erguido em materiais perecíveis, fora reconstruído em betão e cantaria, para assinalar os quinhentos anos da morte do Infante. Uma caravela estilizada faz-se ao mar, levando à proa o Infante D. Henrique e alguns dos protagonistas da gesta ultramarina e da cultura da época, navegadores, cartógrafos, guerreiros, colonizadores, evangelizadores, cronistas e artistas, retratados com os símbolos que os individualizaram. Jacinto, reparava agora, posava debaixo da efígie de Bartolomeu Dias, a sua personagem no teatrinho do liceu. Pensaria nele todos os dias? Faria dele o seu modelo, a sua inspiração?
Isabel Rio Novo, A Matéria das Estrelas, no prelo
(Prémio Literário Cidade de Almada)