Falar do que dói
Lídia Jorge escolheu como tema do seu último romance, Misericórdia, a vida num lar de terceira-idade. É um assunto tremendo, mas que deve ser abordado de todas as formas e feitios, até porque o ser humano está a durar cada vez mais tempo e os lares são um dos mais previsíveis destinos para quem envelhece e se torna um fardo, ou simplesmente para quem não tem quem possa acompanhá-lo nos últimos anos de vida. Como dizia Steiner, os novos não têm de levar connosco, e dou-lhe razão, mas enquanto puder prefiro ter a minha mãe quase centenária na sua casa a interná-la numa instituição. Sei que em tempos falei aqui no blogue de um livro de banda desenhada de um autor espanhol, Paco Roca, que depois teve uma versão em filme de animação, chamado Rugas, sobre este tema difícil dos lares; era uma história que tomava como protagonista um homem com Alzheimer que o filho e a nora «despacham» (no livro é assim, apesar do que diz Steiner) para um lar e ali acaba por encontrar o mais inesperado cuidador. E agora encontrei um outro livro de BD cuja protagonista é uma senhora nos seus setentas que, depois de enviuvar, tem de sair da sua casa na província por causa de uma expropriação e, como todos os filhos vivem em cidades distantes, dá entrada numa casa de repouso, mas repousa pouco, pensa muito, desvia os outros utentes para aventuras proibidas e até arranja um namorado – embora, claro, continue a odiar estar num sítio daqueles (a colcha, o papel de parede, os horários..., bah!). Chama-se Mergulho, assina-o Séverine Vidal e Vitor Pinel e vale bem a pena. Para, enfim, nos irmos habituando ao futuro.