Humanidade
Uma vez, fui convidada pelo Colégio Moderno, em Lisboa, para participar numa conversa na Semana da Poesia, e fiquei muito agradavelmente surpreendida pelo nível das perguntas e intervenções dos alunos, um dos quais, antes ainda de me dirigir a palavra, fez questão de dizer com uma pontinha de orgulho que era de Humanidades. A palavra, embora não pensemos logo nisso, vem de «humano», e isso, meus amigos, parece-me fazer toda a diferença, embora, na prática, nem sempre os que estudam as ditas Humanidades sejam mais humanos do que os seus colegas de Ciências ou até os seus docentes. Em todo o caso, mesmo correndo o risco de parecer lamechas, encontrei uma carta escrita por um sobrevivente de Auschwitz aos professores de todas as disciplinas que apela a esta humanidade que achei muito oportuna, pois sinto que também é isto que está a faltar no ensino em muitos países civilizados, privilegiando-se a técnica e a especialidade. Diz o autor da carta que viu câmaras de gás construídas por engenheiros qualificados; crianças envenenadas por médicos qualificados; bebés mortos por enfermeiras especializadas; mulheres e crianças mortas e queimadas por tipos que tinham sido excelentes alunos. E acrescenta que por isso tem sérias suspeitas sobre a educação. Pede, assim, aos professores que ensinem os seus alunos a serem humanos, e não monstros treinados ou psicopatas experientes. E conclui: a leitura, a escrita e o conhecimento de aritmética só serão importantes se tornarem as crianças mais humanas. No mesmo dia em que encontro esta carta, dizem-me, porém, que na escola da minha rua, os meninos este ano não vão ter manuais senão digitais nem escrever nada senão com as teclas num ecrã. Robot versus humano?