Livres e acorrentados
O diário francês Libération acusou (como quase todos, imagino eu) uma diminuição significativa do número de exemplares vendidos em 2013. Os administradores da empresa proprietária do jornal consideraram então que se devia fazer alguma coisa para o modernizar e aproximar de uma comunicação mais de acordo com os tempos actuais, e digitais, propondo que ele não fosse apenas um título da imprensa escrita, como até aqui, mas também uma espécie de plataforma geradora de conteúdos e passível de se tornar lucrativa. Pois bem: os jornalistas não gostaram e, traindo o espírito visionário que o jornal possuía quando foi criado em 1973 por Sartre, mostraram-se completamente intransigentes com as modernices e resolveram reclamar dos objectivos da administração no próprio jornal, com uma edição especial em que, na primeira página, declaravam: «Nós somos um jornal.» O mais paradoxal é que quem pagou essa edição foram os administradores, ali duramente criticados, para não dizer enxovalhados, pelas suas ideias monétisables. Mas, ironia à parte, a verdade é que o império do dinheiro chegou a todo o lado; e, se a publicidade deixou de pagar o custo do papel (há jornais que já não têm praticamente anúncios), muitos dos diários e semanários correm o risco de fechar se não se tornarem, de facto, uma coisa completamente diferente da que têm sido. Na edição de livros, foi decerto também a busca do lucro rápido que fez com que os editores se pusessem a publicar livros menores mas potencialmente vendáveis, sem se aperceberem de que estavam a criar leitores crédulos e mal formados, muitos dos quais incapazes de pensar pelas próprias cabeças e de, mesmo com um empurrão, passar a um patamar de leitura superior. No entanto, agora já não é possível voltar atrás, e a recusa dos funcionários do Libé a adaptarem-se a novas estratégias também me parece um pouco exagerada. Até porque, pelos vistos, ainda têm quem lhes «sustente» as críticas...