Loucura
Ninguém que tenha lido A Louca da Casa, de Rosa Montero, pode ter ficado indiferente. É um livro que mistura autobiografia e ficção e que fala da imaginação de forma bem louca e, passe a redundância, imaginativa. De todos os livros da autora, é seguramente o mais marcante (embora ela tenha escrito romances incríveis), e é nessa linha o seu mais recente volume publicado em Portugal e intitulado O Perigo de Estar no Seu Perfeito Juízo, usando um verso «roubado» a Emily Dickinson. A proposta é incrível, pois associa aos criadores uma certa dose de loucura, justificando que para se ser um verdadeiro artista há que ter um desequilibriozinho. Partindo de exemplos reais, a começar pelos seus próprios ataques de pânico em diversas alturas da vida, Rosa Montero conta-nos as histórias fascinantes de alguns escritores a quem foi diagnosticada doença mental (Virginia Woolf, Sylvia Plath, Janet Frame...) e cuja salvação foi muitas vezes a escrita; e fala-nos cientificamente desse grãozinho de loucura que levou tantos autores ao vício ou ao suicídio, como Scott Fitzgerald, Hemingway ou mesmo Bukowski. Ao mesmo tempo, atravessa todo o livro a história de uma mulher anónima que se fez passar pela própria Rosa Montero durante anos, perturbando a autora de O Perigo de Estar no Seu Perfeito Juízo em variadíssimas situações (uma das quais apresentando-se em vez dela numa universidade americana como escritora convidada). Fascinante. Pena que a tradução tenha demasiados castelhanismos («relato» por «conto», «narrador» por «romancista»...), sobretudo porque a tradutora já assinou outros trabalhos de qualidade e não se esperavam dela erros de palmatória (O Ruído e a Fúria, de Faulkner?). Mas leiam na mesma, não se arrependerão.