Maravilhas da aldeia global
Toda a gente que me conhece repara que estou permanentemente a bramar contra as novas tecnologias. Claro que sei perfeitamente a falta que me fazem quando as não tenho, e o jeito que me dão a toda a hora, embora não seja de modo algum uma dependente, sobretudo do telemóvel, que uso apenas quando preciso mesmo de ligar a alguém, usar a Via Verde para o estacionamento ou ver o e-mail de longe. Nunca teria provavelmente escrito um romance se não tivesse um computador (na altura, era bastante primário, com disquettes), nem o meu trabalho renderia o que rende e chegaria ao público sem a ajuda da Internet, dos blogues, do correio electrónico, das redes sociais. Mas também tenho consciência de que o digital tornou as pessoas muito mais agressivas, pouco empáticas, obcecadas com os aparelhos, excessivamente comunicativas (ou seja, sempre a dizer sem dizer) e menos profundas, incapazes de ler um texto longo (é por isso que nas redes mostram só as cinco primeiras linhas e depois escrevem «Ver mais»). No entanto, esta semana reconciliei-me com a aldeia global. Queria publicar um livro, que por acaso tinha uma tradução feita por cinco alunas de um mestrado sob a supervisão de um professor em 2006, mas os contactos que o professor me facultara para as consultar eram quase todos obsoletos. Com muita teima minha (porque a maioria delas tinha nomes bastante comuns), lá fui fazendo buscas, do Facebook para o Instagram, do Instagram para o Linkedin, do Google para a faculdade onde estudaram há quase vinte anos, e lá consegui a proeza de encontrar o paradeiro de cinco desconhecidas, que já quase não sabem umas das outras, mas ajudaram também elas no que puderam. E, finalmente, o problema resolveu-se e o livro, se tudo correr bem, pode sair rapidamente. Um caso para dizer: agora vê se não dizes tão mal das proezas da tecnologia...