Memória de uma voz
Há histórias que parecem ficção. Uma delas contou-a Nelson Ferreira da Silva no Facebook e eu reproduzo-a aqui no blogue, porque merece ser partilhada. Como todos os que já perderam alguém importante certamente sabem, a memória da voz é uma das coisas que mais rapidamente desaparecem. Ora, também todos os que já foram a Londres devem saber que, no metro, estão sempre a avisar-nos «Mind the gap» para vermos bem onde pomos os pés ao entrar e sair da carruagem. Pois parece que uma certa viúva se deslocava diariamente a uma estação da Northern Line do metro londrino por ser do falecido marido a voz que prevenia nos altifalantes «Mind the gap». Acontece que, com as modernices, as mensagens humanas foram sendo substituídas em todas as estações por vozes robotizadas e, um dia, aconteceu o mesmo à mensagem que a viúva vinha expressamente ouvir. Ela procurou então a empresa para pedir a antiga gravação. Só que, ao contar a sua história, aconteceu o milagre: não só lhe conseguiram o que pediu, como até repuseram a gravação original na estação de metro. Parece ficção, disse eu quando comecei a escrever este post. E é numa ficção, lembrada (e muito bem) por Maria Manuel Viana (a tradutora) como comentário a esta história (para ser mais concreta, em Dia de amanhã, de Ignacio Martínez de Pisón), que uma viúva vai ao cinema todos os dias para ouvir a voz do marido que era quem dobrava o actor principal.