O escuro iluminado
Quando compro os direitos de um livro estrangeiro, é comum acontecer que esse mesmo livro apareça nas listas de algumas editoras de outros países que também gostam de apostar em nomes novos. Tenho, por isso, muitos livros em comum com a Prometheus na Holanda, a Voland ou a La Nave de Teseo em Itália, a Anagrama em Espanha, a Suhrkamp na Alemanha e por aí fora. São as chamadas afinidades editoriais... Não terei partilhado muitos títulos com a grande Hanser, mas ainda assim descobri num encontro há cerca de dois anos com um dos seus editores que tínhamos gostos semelhantes. Depois de uma conversa muito simpática por alturas da Feira do Livro, ele aconselhou-me a leitura de Luto, do guatemalteco Eduardo Halfon (enviou-me até o PDF da edição brasileira), e só não o publiquei porque, imaginem!, a minha colega Cecília Andrade da Dom Quixote chegou primeiro... Luto saiu há cerca de duas semanas em Portugal e é uma pequena maravilha (e digo «pequena» porque só tem 112 páginas). Inscreve-se no universo familiar do autor, que não é estranho a outras das suas obras onde Halfon é também personagem, e conta a história de como o irmão mais velho do seu pai, Salomón, morreu muito jovem afogado num lago perto da casa dos avós. É numa visita a esse lago muitos anos depois de ter abandonado a Guatemala que as memórias de infância de Halfon regressam e, com elas, os segredos sobre essa morte de que é preciso fazer finalmente o luto. Breve mas intenso e belíssimo, com as palavras todas e sem gorduras, um livro sensível e terno que foi justamente multipremiado.