O poder das histórias
Na última página do livro, o editor escreve com que tipo de letra foi composto e onde foi impresso o “romance” que acabámos de ler. Ora, embora se leia como um romance e fale sobretudo do “poder redentor das histórias”, Esta Distante Proximidade, de Rebecca Solnit –, uma das ensaístas mais aclamadas dos EUA na actualidade – não é um romance, e quase apostaria que no país de origem figura nas listas de livros de não-ficção. Na verdade, parte do livro é realidade, autobiografia, e a outra parte reflexão e sugestão de teoria. Mas tudo está ligado efectivamente pelas histórias – mitos, lendas, fábulas, contos de fadas, histórias da História e também coincidências e episódios da vida da autora. Tudo escrito como numa série de espelhos, nos quais vemos antes de tudo Rebecca Solnit, mas vemos também muitas outras pessoas e nos vemos até a nós de vez em quando. Estamos, no fundo, ligados pelas histórias, próximas e distantes – e estas que se nos apresentam aqui falam de Alzheimer e cancro, mas também da Islândia e dos ursos polares, de viagens contemporâneas e antigas, de obras de arte imorredoiras e instalações vanguardistas, de palavras e da sua etimologia; e de damascos – sim, de damascos –, pois é com pilhas deles que tudo começa e acaba nestas páginas profundas, bonitas, cheias de ideias muito atraentes e de parágrafos notáveis. (O meu preferido está na p. 127 e é sobre empatia.) Vale muito a pena ler, asseguro, mesmo para quem só costuma ler romances.