Sempre curiosa a respeito de novos autores, leio uma estreia vigorosa e muito aclamada de uma mais ou menos jovem norte-americana (36 anos) que, ao que sei pela badana, foi para Brooklyn ser empregada doméstica para poder escrever um romance. Pois saiu-se bem: os principais jornais e revistas de confiança nestas coisas – o Guardian, a New Yorker, o Economist, entre dezasseis publicações – consideraram A Vida Amorosa de Nathaniel P. um dos livros do ano. O protagonista, Nate para os mais próximos, acaba de negociar a sua primeira incursão na escrita ficcional por uma bela maquia (tudo indica que vai ter sucesso), é inteligente, bonito e culto, mas soma culpas por todas as mulheres que tem vindo a abandonar ao longo da vida, porquanto não parece saber viver um relacionamento sério, mesmo quando isso o faz sentir surpreendentemente bem. Desta feita, é Hannah, também aspirante a escritora publicada, igualmente culta e sofisticada, quem sofre os reveses da sua relação com o belo e interessante Nate, que tão depressa quer como não quer a sua companhia, a sua conversa e o seu sexo. Uma surpresa mesmo boa é ver como a autora, Adelle Waldman, se mete na pele de um homem e pensa masculino o tempo todo, falando das obsessões e medos do macho intelectual americano, que não perdoa o menor deslize cultural às suas parceiras. As conversas do grupo de amigos são, de resto, de um elitismo bastante inesperado, mas, enfim, estamos em Brooklyn, o bairro dos meninos que estudaram em Harvard e na Brown, procuram empregos em boas editoras e leram Proust e Flaubert. Vou ainda a meio e posso dizer que gosto bastante desta Hannah, vamos lá ver se ela consegue dar a volta ao difícil Nathaniel P.
5 comentários
António Luiz Pacheco 02.04.2015
Caro e Extraordinário Miguel Rosa
É evidente a sua bagagem literária e cultural, e creia que aprecio os seus comentários por isso mesmo, pois tento aprender sempre!
Estimo que não o tenha de algum modo ofendido com a minha resposta acerca da sua defesa ao Lobo Antunes, e se o fiz peço me desculpe na minha ignorância e atrevimento ao tentar fazer humor com a situação. Não era essa a minha intenção!
De qualquer modo, deixe-me dizer-lhe que não conhecia o autor que refere andar a ler, e pelo que resume parece-me ser um tema dos que me agradam.
A propósito do que diz sobre essa obsessão americana, lembro-me de uma vez, numa visita profissional a supermercados nos EUA, ter referido a extrema limpeza e cuidado com o chão de uma secção de frutas e legumes numa grande loja. O gerente que nos guiava, explicou que se houvera um simples talosito de alface no chão, capaz de fazer escorregar alguém, logo haveria quem se servisse dele para uma queda e tentar nunca mais trabalhar com a indemnização recebida!
Haverá esse livro traduzido para português? Confesso que detesto ler inglês... e só o faço por razões profissionais, como ainda há pouco acabei de traduzir um excerto do "All aboutPotatoes by Tolsma", sobre conservação da batata de semente. Mas ler por prazer... em inglês, não!
Pacheco, como a Patrícia respondeu, existe o "Ágape e Agonia," (belíssimo romance) e nos anos 80 traduziu-se o "Gótico Americano," hoje esgotado. Gaddis nunca foi muito famoso nos próprios EUA, é mais um escritor de culto, admirado por outros escritores mas ignorado pelo grande público, por que motivo temo que não suscite interesse nas editoras portuguesas. Convém sempre notar que a heróica Ahab faliu, essa é a sina das pequenas editoras que tomam riscos.