Interesso-me, naturalmente, pelo que produzem alguns escritores que começaram a publicar já neste século XXI – e não passei, por isso, ao lado do romance de estreia de Bruno Vieira Amaral, As Primeiras Coisas, de que falei aqui no blogue na altura em que saiu e que, mais tarde, ganharia o Prémio Literário José Saramago, entre outros. Mas, sendo esse um livro bastante peculiar, com uma longuíssima lista de personagens que, frequentemente, não chegam a cruzar-se, era muito difícil saber o que o autor faria a seguir, sobretudo em termos de estrutura. O que ando a ler é justamente o seu segundo romance, Hoje Estarás Comigo no Paraíso, recentemente publicado pela Quetzal. E é um livro muito diferente (o que são boas notícias), mais articulado, de grande maturidade (literária e não só), que poderia claramente ter sido escrito por alguém mais velho, dada a ampla reflexão sobre uma panóplia de assuntos e a cultura que habita o texto sem nunca se exibir. Partindo da história real do assassínio de um primo do próprio autor aos vinte e um anos – morte violenta –, o romance é, a um tempo, a investigação sobre os factos e as suas razões e uma permanente revisitação da vida familiar e social do narrador, com páginas belíssimas (e também tristíssimas) sobre a infância e figuras inesquecíveis, como, de resto, já se encontravam na obra anterior. A ler, evidentemente.
3 comentários
Puck 02.05.2017
Ainda bem que os livros flutuam! Adorei os encómios, à falta de poder mandar embrulhar meia dúzia para levar para casa, talvez acrescente esse livro à lista. Ó Pacheco tem a certeza que não conhece o Fermín Romero Torres? Bibliógrafo da Sempere e Filhos? Quase que ia jurar que podiam ser aparentados.
Carlos Ruiz Zafón é um escritor espanhol, nascido em Barcelona, em 1964. Seu romance de estreia, “O Príncipe da Névoa”, foi lançado na Espanha, premiado e traduzido para vários idiomas.
O que Zafón entrega ao leitor é puro entretenimento e, às vezes, é só isso mesmo o que se quer: um livro envolvente, bem escrito, divertido. Provavelmente, ele traz essas marcas de sua atuação como roteirista em Los Angeles. Seus livros têm sempre um clima noir, envolvem algum crime ou mistério. Entre eles, “A Sombra do Vento”, que se passa na Espanha Franquista, a partir de 1945, continua a ser meu preferido, talvez porque tenha sido aquele que me apresentou a Fermín Romero de Torres, que rouba a cena e arrisco que seja um de meus personagens favoritos, de todos os tempos.
Fermín é inteligentíssimo, debochado, dono de um humor ácido e irônico. Torna-se fiel escudeiro de Daniel Sempere, filho de um viúvo livreiro que luta para manter as contas de sua livraria em dia. Ao buscar a solução para um mistério, Fermín e Daniel nos levam a um passeio por Barcelona e seu Bairro Gótico. Essa é uma característica dos romances de Zafón: folhear suas páginas é como ser levado, por um guia local e apaixonado, a conhecer as entranhas da capital catalã."